Para ACNUR, 2009 foi o “pior” ano da repatriação voluntária em duas décadas
Para ACNUR, 2009 foi o “pior” ano da repatriação voluntária em duas décadas
GENEBRA/BRASÍLIA, 15 de junho de 2010 (ACNUR) - Ao final de 2009, o número de pessoas forçadas a se deslocar por causa de conflitos e perseguições totalizou 43,3 milhões em todo o mundo, a maior cifra de deslocamentos forçados por estes motivos desde a metade dos anos 90. O número consta do relatório Tendências Globais 2009, divulgado hoje pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) em todo o mundo.
O relatório revela ainda que o número de refugiados repatriados voluntariamente para seus países de origem caiu ao nível mais baixo em 20 anos. A íntegra do relatório está disponível em: http://www.unhcr.org.
Produzido anualmente pelo ACNUR, o documento indica que o número médio de refugiados no mundo permanece relativamente estável (15,2 milhões), sendo dois terços sob os cuidados do ACNUR e o restante sob o mandato da UNRWA (agência da ONU que se dedica exclusivamente a refugiados palestinos). Por causa da crescente persistência dos conflitos, mais da metade dos refugiados sob os cuidados do ACNUR estão em situações de refúgio prolongado – há mais de cinco anos no exílio.
“Conflitos importantes, como no Afeganistão, na Somália e na República Democrática do Congo não mostram sinais de solução”, disse hoje o Alto Comissário da ONU para Refugiados, António Guterres. “Conflitos que pareciam estar terminando ou em vias de serem solucionados, como no sul do Sudão ou no Iraque, estão estagnados. Como resultado, 2009 foi o pior ano, em duas décadas, para a repatriação voluntária”.
O relatório do ACNUR mostra que apenas 251 mil refugiados retornaram para casa em 2009 – o menor número desde 1990. Nos últimos dez anos, os retornos voluntários chegavam a cerca de 01 milhão, por ano.
“A maioria dos refugiados do mundo tem vivido no exílio há cinco anos ou mais. Inevitavelmente, esta proporção crescerá, uma vez que menos refugiados têm condições de retornar para casa”, adicionou Guterres, referindo-se aos mais de 5,5 milhões de refugiados sob o mandato do ACNUR que em situações prolongadas de refúgio.
O número de pessoas deslocadas por conflitos em seus próprios países (os chamados deslocados internos) cresceu 4%, chegando a 27,1 milhões ao final de 2009. Os persistentes conflitos na República Democrática do Congo (RDC), Paquistão e Somália explicam esta realidade, de acordo com o relatório Tendências Globais 2009.
O documento também revela que um número cada vez maior de refugiados está vivendo em cidades, principalmente no mundo em desenvolvimento, o que contrasta com a percepção comum de que estas pessoas estariam inundando as nações industrializadas.
O número de novos solicitantes de refúgio no mundo chegou a quase 01 milhão, sendo que a África do Sul é o hoje o principal destino de solicitantes de refúgio no mundo – cerca de 220 mil novos pedidos no ano passado.
O relatório Tendências Globais 2009, que revisa tendências e padrões de deslocamentos relacionados a conflitos, também analisa as pessoas apátridas e revela que o número de pessoas reconhecidas nesta situação ao final de 2009 era de 6,6 milhões – embora cifras extra-oficiais estimem uma população de apátridas de até 12 milhões de pessoas.
O ACNUR protege, assiste e busca soluções para os refugiados. A persistência de conflitos torna mais difícil o retorno voluntário aos países de origem, o que geralmente é a situação preferida para países de refúgio e refugiados.
Em relação ao reassentamento – que transfere refugiados de um país e os realoca permanentemente em outro – o ACNUR submeteu um número recorde de pedidos o ano passado (128 mil indivíduos), o maior nos últimos 16 anos. Ao final de 2009, 112.400 refugiados haviam sido recebidos por programas de reassentamento em 19 países.
Refúgio no Brasil
De acordo com as estatísticas do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), divulgadas essa manhã, o Brasil possui 4.294 refugiados (cerca de 30% são mulheres). Deste total, 3.895 foram reconhecidos por vias tradicionais de elegibilidade e 399 foram beneficiados pelo Programa de Reassentamento Solidário. Todos vivem em cidades brasileiras.
Os refugiados de origem africana compõem a maioria desta população (64,9%), seguidos de refugiados do continente americano (22,3%), da Ásia (10,3%) e da Europa (2,2%).
Em relação às nacionalidades, os maiores grupos são formados por angolanos (1.688 pessoas, ou 39,3% do total), colombianos (589 pessoas – 13,7%), congoleses (420 pessoas – 9,8%), liberianos (259 pessoas – 6%) e iraquianos (199 pessoas – 4,6%).
Cabe ao CONARE a implementação no Brasil da Convenção da ONU sobre o Estatuto dos Refugiados (de 1951), como também orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da proteção, assistência e apoio jurídico aos refugiados que se encontram no país.
Presidido pelo Ministério da Justiça e com a participação de integrantes dos Ministérios das Relações Exteriores, Trabalho, Saúde e Educação, do Departamento da Polícia Federal, da sociedade civil e do ACNUR (neste caso, com direito a voz e sem direito a voto), o CONARE analisa e decide sobre as solicitações de refúgio, podendo também decidir pela cessação ou revogação da condição de refugiado. Sua atuação se pauta pela Lei 9.474/97, que o criou e define outros mecanismos de implementação da Convenção.
De acordo com a Lei 9.474/97, será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:
I - devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;
II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;
III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.
No Brasil, o ACNUR desenvolve programas de integração local e reassentamento, atuando em parceria com o CONARE, o setor privado e entidades da sociedade civil organizada – como a ASAV.