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Refugiados sensibilizam sociedade brasileira sobre importância da integração

Comunicados à imprensa

Refugiados sensibilizam sociedade brasileira sobre importância da integração

Refugiados sensibilizam sociedade brasileira sobre importância da integraçãoNa Praça da Sé, localizada no centro da maior metrópole brasileira, refugiados que moram em São Paulo cantam este refrão e balançam bandeiras de diferentes países numa coreografia.
27 Novembro 2014

São Paulo, 27 de novembro de 2014 (ACNUR) – “Viva o Brasil. Viva o Brasil”. Na Praça da Sé, localizada no centro da maior metrópole brasileira, refugiados que moram em São Paulo cantam este refrão e balançam bandeiras de diferentes países numa coreografia ensaiada.

Vista do alto, a imagem que vai se formando pela dança das bandeiras é emoldurada pelas torres neogóticas da Catedral Metropolitana de São Paulo, pelos coqueiros da praça e pelos edifícios da cidade na qual estes refugiados estão refazendo suas vidas, longe de conflitos, guerras e perseguições. Tudo está sendo registrado em um documentário elaborado pelos próprios refugiados como parte de um projeto inédito de sensibilização e conscientização do brasileiro sobre o tema do refúgio.

A homenagem ao Brasil é legítima, mas os refugiados que participaram desta atividade em uma nublada manhã de domingo – além de outros que não estiveram na praça, mas que estão envolvidos com o projeto – consideram que a maioria dos brasileiros desconhece o tema do refúgio. Esta falta de informação, segundo eles, gera preconceito e dificulta sua integração social e econômica no Brasil.

Para tentar mudar esta situação, vários refugiados que vivem no Brasil – especialmente jovens – se uniram em torno de um projeto para sensibilizar a população brasileira sobre sua situação e seus direitos: trata-se da “Youth Initiative” (ou “Iniciativa Jovem”), promovida pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) em todo o mundo.

O objetivo global da “Iniciativa Jovem” é contribuir para a proteção e o desenvolvimento de habilidades dos jovens refugiados por meio de projetos que são pensados, elaborados e executados por estes mesmos jovens. Neste contexto, propostas elaboradas por jovens refugiados em mais de 60 países foram submetidas ao ACNUR e somente 16 foram selecionadas: entre elas, o projeto de sensibilização construído pelos jovens refugiados que vivem em São Paulo.

A atividade realizada na Praça da Sé é parte deste projeto e será incluída em um videoclipe que busca desconstruir algumas das visões incorretas e estereotipadas que, segundo eles, muitos brasileiros possuem sobre o tema.

No vídeo, os refugiados reproduzem a chegada em São Paulo com malas identificadas com as bandeiras de seus países, mas também com adesivos representando estereótipos negativos normalmente associados à sua terra natal. Quando essas malas são abertas, começa a desconstrução dos preconceitos, que é embalada por uma música composta pelo grupo. Muitas das cenas têm sido mantidas em segredo, para não quebrar o impacto do lançamento do videoclipe, previsto para o final deste ano.

Mesmo não tendo o português como sua língua materna, os refugiados que compuseram a música do videoclipe escreveram a letra em português, para inserir somente ao final da música algumas frases em seus próprios idiomas. Do árabe ao espanhol; de urdo ao iorubá, os quase dez idiomas registrados na música representam a diversidade da população refugiada no Brasil: cerca de 7.200 pessoas, de mais de 80 nacionalidades diferentes.

“Eu saí da minha terra pra salvar a minha vida, e têm várias histórias que a gente passou”, dizem os primeiros versos da canção, que retrata vários fatos que levam uma pessoa a se tornar um refugiado. O reconhecimento pelo acolhida dada no Brasil vem a seguir: “Viver aqui nos traz esperança. Queremos compartilhar a nossa cultura. Brasil nos dá mais segurança. Nós somos muito mais felizes agora”.

 O vídeo também traz depoimentos sobre a vida dos refugiados no Brasil, nos quais contam fragmentos de sua história e reconhecem a generosidade do país em acolhê-los e as oportunidades para começar uma nova vida.

Coordenado pela equipe da Caritas Arquidocesana de São Paulo, o projeto envolveu discussões entre os próprios refugiados, que identificaram as principais barreiras à sua integração no país.

O projeto vem sendo executado desde agosto de 2014 e inclui – além da realização do vídeo – oficinas de trabalho com os refugiados sobre seus direitos e deveres no Brasil e sobre criação, redação, roteiro e música. Estas oficinas foram desenvolvidas ao longo dos vinte encontros que antecederam a gravação da música (em um estúdio) e do videoclipe. 

Um dos mais ativos participantes do projeto é o jovem Uchen Henry, de 21 anos, refugiado da Nigéria que vive no Brasil há quase dois anos. Ele deixou seu país por causa de perseguições a ele e à sua família e atualmente trabalha como professor de inglês em uma escola particular.

“O Brasil dá segurança e esperança para os refugiados, mas os brasileiros precisam entender melhor quem somos e porque estamos aqui”, afirma Uchen. Ele conta que as pessoas costumam confundir as palavras “refugiado” e “fugitivo”, o que deixa os refugiados numa situação incômoda – pois gera reações de medo, e não de solidariedade.

Para o refugiado sírio Talal Altinawi, que passou a integrar o projeto a partir da gravação do videoclipe,  “os brasileiros devem saber que os refugiados são pessoas como outras quaisquer”. Ele chegou ao país há dez meses, com a mulher e duas filhas. Um novo filho está a caminho, pois sua mulher está grávida de seis meses. “Somos irmãos e devemos viver em harmonia”, afirma Talal, que trabalha atualmente como engenheiro mecânico, exercendo a mesma profissão na qual se graduou na Síria.

Para alguns refugiados, a participação no projeto tem sido uma maneira de externar opiniões e de se fazer ouvir. “Podemos nos expressar, e sinto que não estamos sós”, afirma o colombiano Álvaro Rodriguez (*), que aos 40 anos vive no Brasil com as duas filhas e a mãe.

Os refugiados fizaram uma apresentação com as bandeiras de seus países.

Assim como Talal e sua esposa, Rodrigues e seus filhos foram convidados pelos jovens responsáveis pelo projeto para participar das filmagens e representar as famílias que chegam ao Brasil, após sofrerem perseguições e situações de guerra em seus países.

“Quando falo que sou um refugiado, pensam que sou um delinquente, que estou escondendo algo. E isso se dá por desconhecimento”, atesta Álvaro, que trabalha como cozinheiro em um restaurante no centro da cidade. “Espero que o vídeo possa ajudar a esclarecer estes conceitos”, espera Álvaro.

Para o representante do ACNUR no Brasil, Andrés Ramirez, este projeto “está ajudando os jovens refugiados a criar um novo significado sobre o que é ser um refugiado no Brasil e a trabalhar habilidades em conjunto com outras nacionalidades, fazendo com que se percebam como um grupo com demandas específicas e similares”.

Ramirez lembra que o projeto acontece em um momento significativo para as estatísticas de refúgio no Brasil. Segundo documento divulgado recentemente pelo ACNUR e pelo Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), o número de pedidos de refúgio no país aumentou mais de 930% entre 2010 e 2013 (de 566 para 5.882 pedidos). Até outubro de 2014, já foram contabilizadas outras 8.302 solicitações. A maioria dos solicitantes de refúgio vem da África e da Ásia (inclusive Oriente Médio).

O número de refugiados reconhecidos também aumentou expressivamente neste período. Em 2010, 150 refugiados foram reconhecidos pelo CONARE, enquanto em 2014 (até outubro) houve 2.032 deferimentos pelo CONARE, o que representa um crescimento aproximado de 1.240%.

Por Luiz Fernando Godinho, de São Paulo