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“É um trabalho maravilhoso, mas eu gostaria que não fosse necessário”

Comunicados à imprensa

“É um trabalho maravilhoso, mas eu gostaria que não fosse necessário”

10 May 2021
Kristin Riis Halvorsen, chefe do escritório do ACNUR em Tapachula, México, em um abrigo para solicitantes de asilo. © ACNUR / Pierre-Marc René
Nome: Kristin Riis Halvorsen, 43, norueguesa

Por que você se tornou uma trabalhadora humanitária?
Desde que eu me lembro, sempre me preocupei com a justiça ou, melhor dizendo, com a injustiça no mundo. Eu tive sorte de crescer em um país onde há uma grande ênfase no engajamento da sociedade civil, então você se envolve rapidamente. Durante o ensino médio, eu levantei fundos para projetos no Afeganistão e na África do Sul para garantir que visitantes desses países pudessem viajar pela região, conversar com escolas e se encontrar com pessoas. Uma coisa levou a outra e, quando eu estava fazendo meu mestrado na Colômbia, eu me deparei com uma página de recrutamento do ACNUR. Eu li e pensei “isso é interessante e significativo”, e então me candidatei. Alguns meses depois, eu consegui meu primeiro emprego.

Qual é o aspecto mais gratificante/desafiador do seu trabalho?
A coisa mais gratificante do meu trabalho é que é algo bastante notável, um presente, ser capaz de acordar todos os dias e ir para o trabalho sentindo que o que você faz é significativo. Nos últimos 13 anos eu nunca tive um dia que acordei e pensei “por que estou fazendo isso mesmo?”, porque o trabalho para mim sempre foi algo significativo. Nós estamos perto o suficiente das pessoas para ver os resultados tangíveis do que fazemos.

Atualmente eu supervisiono quatro times diferentes cobrindo todo o sul do México. Meu trabalho é garantir que o escritório consiga operar. O time cresceu desde os 20 funcionários que tinha quando eu comecei em 2018. Hoje em dia estamos com quase 150 funcionários para responder a um aumento de solicitantes de asilo, sobretudo de Honduras, El Salvador e Guatemala. As pessoas estão fugindo pelas suas vidas. Dez ou 15 anos atrás costumavam ser rapazes solteiros e sãos fazendo essa jornada pelo México. Agora vemos grandes grupos familiares. Quando você vê uma avó ou uma grávida de sete meses cruzando a fronteira, significa que a situação em seus países realmente os deixou sem esperança.

Para mim, o aspecto mais difícil é ser a pessoa que tem que viver com as decisões sobre o que podemos e não podemos fazer. Às vezes ficamos diante de situações complexas e prolongadas e os doadores em algum momento começam a olhar para outras situações. Em Uganda, às vezes significava ter que ficar na frente de uma mulher com quatro ou cinco filhos e explicar que “você está no país há tanto tempo que não vai mais conseguir comida”. Para nós que estamos perto das pessoas e conhecemos muito bem suas necessidades, entender que eles não serão capazes de ter tudo o que precisam é realmente de partir o coração. Seria incrível viver em um mundo onde ninguém fosse forçado a deixar sua casa. É um trabalho incrível, mas eu preferia não o fazer.

Kristin distribui kits escolares aos alunos do ensino fundamental em Tapachula © ACNUR / Carlos Colmenares

Qual foi seu melhor dia de trabalho?
Cerca de um mês depois de chegar à Tapachula, pudemos apresentar uma peça no teatro da cidade que tinha capacidade para mil pessoas. Com a ajuda de autoridades locais, pudemos enchê-lo com jovens estudantes dos arredores de Tapachula e apresentamos uma peça escrita por duas jovens cujos pais chegaram ao México como refugiados do Brasil e da Argentina, fugindo de ditaduras. Quando a peça acabou, as crianças não sabiam se deveriam aplaudir – mas então eles começaram e aplaudiram, aplaudiram muito. Foi extremamente gratificante alcançar uma parte da comunidade que normalmente não alcançamos com uma mensagem de inclusão e compreensão.

Qual foi o seu pior dia de trabalho?
O rosto dessa menina continua a me assombrar. Eu estava no estado de Rakhine, em Mianmar, onde estávamos trabalhando duro para chegar aos campos mais remotos para deslocados internos. Nós chegamos a nos deslocar de barco para chegar a esses lugares. Existia um campo onde as pessoas estavam deslocadas apenas a alguns metros e podiam ver seu vilarejo e a escola, apesar de não conseguirem voltar.  Em uma das visitas, as crianças decidiram usar o uniforme escolar. Eu já conhecia uma das garotas, que estava sentada na primeira fila, bem arrumada e com o uniforme escolar impecável. Ela nos observava com esperança nos olhos, e eu me senti incrivelmente inútil. A escola estava apenas 200 metros de distância e nós não poderíamos levá-los até lá. Nós temos que buscar todas as oportunidades possíveis para fazer a diferença para aquela garotinha. Para cada menina, vendo os anos passarem e seus sonhos desaparecerem. Devemos sempre procurar maneiras de fazer mais.


A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) é uma organização dedicada a salvar vidas, proteger os direitos e garantir um futuro digno a pessoas que foram forçadas a deixar suas casas e comunidades devido a guerras, conflitos armados, perseguições ou graves violações dos direitos humanos. Presente em 135 países, o ACNUR atua em conjunto com autoridades nacionais e locais, organizações da sociedade civil e o setor privado para que todas as pessoas refugiadas, deslocadas internas e apátridas encontrem segurança e apoio para reconstruir suas vidas.

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