Refugiados e anfitriões trabalham juntos para construir casas ecológicas no Níger
Refugiados e anfitriões trabalham juntos para construir casas ecológicas no Níger
Uma estrada recém-pavimentada divide a cidade de Ouallam em dois mundos. Do lado direito da rua, abrigos precários e improvisados estão espalhados ao lado de latrinas temporárias, de tendas servindo como escolas provisórias e centros de distribuição de alimentos.
Do lado esquerdo, casas robustas de tijolos com janelas estão são erguidas em grandes lotes organizados. Construídas com tijolos ecológicos, as casas devem resistir ao clima severo do deserto de 25 a 30 anos. Em breve, uma escola primária será construída, não muito longe do posto de gasolina que já está aberto.
Hoje, a refugiada do Mali, Mariam, atravessou esta estrada. Depois de cinco anos em um abrigo temporário no remoto campo de refugiados de Mangaize, a mãe solteira de quatro filhos será uma das primeiras a se mudar para uma casa nesta nova comunidade.
Mariam está seguindo um caminho que milhares de outras pessoas também seguirão. Feitas para refugiados e nigerinos em situação de vulnerabilidade, cerca de 1.000 casas serão construídas nos próximos 18 meses. A comunidade segue um projeto estruturado pelo ACNUR, Agência da ONU para Refugiados, e seus parceiros para criar soluções mais fortes e duradouras para os refugiados, enquanto aguardam uma resolução para o conflito que os forçou a deixar seu país.
"Esta casa vai mudar nossas vidas", disse Mariam Walate Intanere, 25 anos, sentada nos tijolos que em breve se tornarão sua nova casa.
"Durante a estação das chuvas, tenho que reconstruir constantemente o abrigo e colocá-lo no chão de novo e de novo. Será bem mais seguro, não dá nem para comparar."
O ACNUR e o governo nigerino fizeram da mudança de refugiados dos campos para as comunidades locais uma prioridade máxima com o passar dos anos, ao passo que a situação no Mali permanece instável. A participação na comunidade local permite que refugiados se adaptem melhor ao ambiente, mas também desfrutem de direitos fundamentais, como a liberdade de se mudar, trabalhar, ir à escola ou visitar um médico.
"Esta casa vai ajudar a nossa família a ficar segura e protegida durante a estação chuvosa"
Mas em lugares como Ouallam, que já abriga uma população em situação de vulnerabilidade, o processo também deve fortalecer a infraestrutura e as instituições locais. Para esse fim, o ACNUR e seus parceiros começaram a reforçar os sistemas de água e a investir em escolas e centros de saúde. Até o trabalho de construção das 1.000 novas casas beneficiará a comunidade anfitriã, pois metade dos 400 empregos serão destinados a membros da comunidade local e a outra metade será destinada a refugiados.
"Existe um forte espírito de colaboração aqui em Ouallam entre a comunidade local e os refugiados, o que estabelece uma base sólida para esse projeto inovador", disse o Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, durante uma visita a refugiados e residentes locais de Ouallam.
Grandi estava lá para se encontrar com as duas primeiras famílias - uma família local e uma família de refugiados - que se mudarão para essas novas casas. Essas discussões marcaram o início de uma visita que Grandi fará a três países para destacar os desafios que o Níger e a região do Sahel enfrentam.
No entanto, os alicerces que os refugiados e seus anfitriões estão construindo na área urbana de Ouallam devem ser capaz de suportar as crises que a cercam.
Atualmente, o Níger está absorvendo os impactos das crises que ocorreram no Sahel, uma região frágil que abrange uma série de países ao sul do Saara. A revolução de 2011 na Líbia e o conflito de 2012 no Mali, durante os quais uma coalizão de grupos armados dominaram grandes partes do país, levou dezenas de milhares a se refugiarem no Níger.
A violência se espalhou pelas fronteiras à medida que terroristas, o crime organizado e bandidos exploravam a tensão étnica, a pobreza e a fraca governança para promover seus próprios objetivos. Burkina Faso, Mali e Nigéria foram dilacerados por lutas étnicas e violência que obrigaram milhares de pessoas a fugir. O Níger agora abriga mais de 215.000 refugiados, a maioria vindos do Mali e da Nigéria.
Hoje, o Níger enfrenta sua própria crise. O aumento da violência dentro de suas próprias fronteiras levou a um deslocamento interno maciço de cidadãos, bem como dos refugiados que abriga. Nas regiões limítrofes de Burkina Faso e Mali, mais de 80.000 nigerianos foram forçados a fugir, um aumento de 50% em relação ao ano passado. Nas últimas duas semanas, 600 chegaram a Ouallam.
Hana Abdou, 63, disse ao ACNUR que um grupo armado ameaçou sua comunidade e os forçou a deixar a vila de mãos vazias. Levaram nove dias para viajar 150 quilômetros. Durante dois dias, eles não comeram ou beberam água. Foi a segunda vez que Hana foi forçada a fugir.
"Precisamos continuar prestando assistência, mas também pensar em soluções de longo prazo"
No início deste mês, terroristas atacaram uma base militar nigerina, deixando pelo menos 89 pessoas mortas. Foi o ataque mais mortal que o Níger sofreu nos últimos anos. Após o ataque, o ACNUR recebeu relatos de grupos armados sequestrando e matando civis e saqueando propriedades.
Apesar do aumento dos desafios que enfrenta, o Níger, um dos países mais pobres do mundo, continua sendo um dos mais generosos em relação aos refugiados.
O governo do país levantou a ideia de fornecer moradia para 40.000 refugiados em dezembro de 2019, durante o primeiro Fórum Global sobre Refugiados realizado pelo ACNUR em Genebra. O governo disse que isso ofereceria aos refugiados uma alternativa ao isolamento da vida no campo.
Com grande parte do Níger enfrentando um estado de emergência e operações militares em expansão, o ACNUR e outras organizações humanitárias não conseguiam mais alcançar muitas pessoas deslocadas, incluindo refugiados, privando pessoas já vulneráveis de serviços essenciais e assistência de emergência.
Com a ameaça de violência crescendo a cada dia, o ACNUR e o Governo do Níger não tiveram escolha a não ser acelerar o plano. Ouallam, assim como as cidades de Ayerou e Abala, ofereceu um refúgio urbano seguro e uma oportunidade econômica. É por isso que o ACNUR correu para realocar refugiados lá.
"O aumento da insegurança e do deslocamento são muito preocupantes", disse Grandi. "É por isso que precisamos continuar prestando assistência às pessoas com necessidades imediatas, mas também pensar em soluções a longo prazo para garantir que refugiados e qualquer pessoa forçada a partir de casa possa viver rapidamente de forma mais independente."