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Ativista salvadorenha transgênero enfrenta a violência em El Salvador

Comunicados à imprensa

Ativista salvadorenha transgênero enfrenta a violência em El Salvador

Ativista salvadorenha transgênero enfrenta a violência em El SalvadorApesar de ter sido forçada a sair de casa por causa de ameaças, a ativista fala sobre violência contra lésbicas, gays, bissexuais, pessoas transgênero e intersexuais.
6 Dezembro 2016

SAN SALVADOR, El Salvador, 05 de dezembro de 2016 (ACNUR) - Depois de ter sobrevivido a três atentados, a transgênero e ativista natural de El Salvador, Karla Avelar, continua se mudando de cidade em cidade para evitar que mais um ato contra ela aconteça. No último ano, ela se mudou quatro vezes devido as ameaças que recebeu por telefone, pela internet e também por carta. “Eu sobrevivi a três tentativas de assassinato, mas não acredito irei sobreviver a mais uma”, disse Avelar, de 38 anos, mostrando as marcas de bala e facada que cobrem seu corpo.

Avelar disse que não confia na proteção da polícia porque raramente as delegacias de El Salvador levam a sério ataques contra pessoas transgênero. As forças policiais também estão atônitas no país que tem a taxa de homicídios mais elevada do hemisfério ocidental – em 2015 foram mais de 6.000 homicídios em um país de apenas seis milhões de pessoas. E como um esforço à mais em sua luta, Avelar é soropositivo.

Mesmo com as constantes ameaças, ela continua lutando não apenas por ela, mas também pelos outros. Avelar lidera o grupo ativista Comunicando e Capacitando Mulheres Trans, conhecido pela sigla COMCAVIS. Sua história ilustra os principais problemas enfrentados por pessoas LGBTI em El Salvador, que faz com que muitas delas deixem o país para proteger a própria vida.

“Eu sobrevivi a três tentativas de assassinato, mas não acredito irei sobreviver a mais uma”.

As pessoas LGBTI, especialmente as mulheres transgênero, não enfrentam apenas ataques por pessoas motivadas por ódio em uma região historicamente homofóbica, mas também têm que lidar com chantagens e ameaças da sangrenta gangue Mara Salvatrucha. A violência faz com que essas pessoas tenham que deixar suas casas, deslocando-se internamente ou solicitando refúgio em algum outro país.

“Existe um número muito grande de pessoas LGBTI que estão tentando escapar e encontrar um lugar mais seguro para viver porque são sujeitos à perseguição com base em sua orientação sexual ", disse Elisa Carlaccini, Representante do ACNUR em El Salvador.

A primeira tentativa de assassinato de Avelar foi em 1992, quando ela ainda era uma adolescente, e foi uma das vítimas de uma série de assassinatos de mulheres transgênero, no que se acreditou ter sido crimes de ódio cometido por um serial killer. Quando o agressor apontou uma pistola para sua cabeça, ela conseguiu desarma-lo, mas o homem tinha outra arma e atirou em Avelar nove vezes. “Eu tive sorte”, disse.

O segundo ataque, em 2008, foi feito pela gangue Mara Salvatrucha. Avelar trabalhava como profissional do sexo e a gangue havia demandado um pagamento semanal de US$ 25 para garantir sua segurança e das outras companheiras. Ela se recusou a pagar. “Eles me ameaçaram e oito dias depois tentaram me matar”, afirmou.

Eles atiraram nela cinco vezes. Ela não somente sobreviveu, como se tornou uma figura pública denunciando os ataques das gangues contra pessoas transgênero. “Eles criaram um ódio de mim, estavam determinados a me matar”, relatou. A gangue atuou novamente em 2012. Dessa vez, com facadas. E mais uma vez Avelar sobreviveu e continuou a chamar atenção do público para a violência.

 Além de cicatrizes profundas, os atentados também causaram lesões em seu intestino, fígado e pulmão, forçando-a a passar por várias cirurgias e complicações. Mas ela garante que os danos psicológicos são ainda piores, pois “todo dia, quando olho para mim mesma, vejo as cicatrizes que me marcaram e choro”.

O número de pessoas fugindo das gangues e outras formas de violência em El Salvador, Guatemala e Honduras aumentou significativamente, a níveis não vistos desde os conflitos armados que assolaram a região nos anos 80. Somente em 2015, os solicitantes de refúgio nestas regiões superaram quase 110.000 - um aumento superior à cinco vezes em três anos.

“Existe um número muito grande de pessoas LGBTI que estão tentando escapar e encontrar um lugar mais seguro para viver”

A maioria das pessoas busca segurança no México, Estados Unidos, Belize, Costa Rica, Nicarágua e Panamá.  Muitos delas, assim como Avelar, foram forçadas a se deslocar internamente.  O ACNUR reconhece que entre os mais vulneráveis estão as pessoas deslocadas LGBTI, embora não haja informação exata de quantas necessitam assistência.

Por sua vez, o ACNUR lançou recentemente o mais abrangente pacote de treinamento para os funcionários e para a sociedade civil que trabalham com pessoas que foram forçadas a se deslocar e são LGBTI. O treinamento também mostra uma visão geral dos avanços da proteção internacional para refugiados LGBTI.

Dentro da comunidade LGBTI de El Salvador muitas pessoas sofreram ataques similares ao de Avelar, inclusive sua amiga Tania Vazquez, que morreu em 2013 depois de ser atingida com um tiro na cabeça.  Desde 1993, cerca de 600 membros da comunidade foram assassinados em El Salvador, de acordo com dados da COMCAVIS.

Avelar reforça que a chave do problema está na força policial por não levar a sério os ataques a população LGBTI. Em uma pesquisa feita com os policias salvadorenhos, 73% acreditam que a homossexualidade é uma doença mental.

“Eu sinto que meu país me deve alguma coisa, e isso me impede de o deixar”.

Entretanto, o governo vem tentando melhorar o policiamento nesta área. Um plano de segurança de 2015 a 2019 tem o objetivo de criar uma relação melhor entre os policiais e a comunidade LGBTI. Em outubro, um juiz sentenciou dois policias a quadro anos de cadeia por agredir um homem transgênero.

Enquanto isso, pessoas LGBTI continuam a deixar suas casas, fugindo dos ataques que sofrem. De acordo com a COMCAVIS, pelo menos 29 pessoas LGBTI deixaram suas casas no país por causa da violência no primeiro trimestre de 2016. 

Enquanto alguns entram com pedido de refúgio em outros países, Avelar optou por permanecer em El Salvador, onde se muda frequentemente. “Eu sinto uma mistura de dor com orgulho”, disse ao se recordar de sua vida conturbada. “Eu sinto que meu país me deve alguma coisa, e isso me impede de o deixar”.