Fugindo da perseguição e da violência por pertencer à comunidade LGBTI
Fugindo da perseguição e da violência por pertencer à comunidade LGBTI
SAN JOSE, Costa Rica, 29 de junho de 2016 (ACNUR) - Dennis, Karla e Rebeca têm algo em comum: nasceram no chamado Triângulo Norte da América Central e fazem parte da comunidade LGBTI. Entretanto, estes dois fatores não os trouxeram muita sorte, pois os três foram vítimas de perseguição e violência por serem quem são.
Dennis, o mais novo de sete irmãos, começou a ter um papel importante como promotor dos direitos humanos e saúde para gays e lésbicas desde quando tinha 23 anos. Começou a trabalhar para a CERPES, uma ONG hondurenha. Entretanto, o período de ativismo durou pouco. O Ódio e a discriminação apareceram e, consequentemente, surgiu perseguição e ameaças por parte de várias gangues ou ‘maras’ contra a comunidade LGBTI, em especial contra as pessoas trans.
Em 2008, um colega de trabalho de Dennis foi assassinado na rua, enquanto caminhava em direção ao escritório da organização. Este crime, assim como outros crimes de ódio contra a comunidade LGBTI, passou despercebido e não foi investigado.
Desde então, Dennis, com 26 anos, começou a receber ameaças anônimas em seu celular. “Mudei de número muitas vezes, mas as mensagens seguiam aparecendo”, disse Dennis. Ele e sua família se deslocaram dentro de seu país inúmeras vezes até que receberam ameaças diretas. “Não queria expor meus pais por minha orientação sexual e decidi fugir”. Ele deixou Honduras sozinho, mesmo com as medidas cautelares de proteção da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
Agora na Costa Rica, depois de muitos anos se escondendo, ele pode ser quem é sem medo, sem preocupações a sua volta ou suspeitando de qualquer pessoa. Em 2012, quando ele foi reconhecido como refugiado junto com outras duas pessoas, pela primeira vez o Governo da Costa Rica havia reconhecido o status de refugiado devido à perseguição por orientação sexual.
Com o apoio da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), Dennis retomou sua vida como ativista e em agosto de 2013, tornando-se cofundador da ONG CasAbierta, onde é oferecido assistência à pessoas da comunidade LGBTI, incluindo solicitantes de refúgio que fogem da América Central, oferecendo assistência médica, jurídica e psicossocial. A organização abriu escritórios em El Salvador, Honduras e Guatemala e conta com uma rede de 60 voluntários, entre advogados e trabalhadores comunitários.
A experiência da Karla não foi muito diferente. Aos 38 anos, esta mulher trans sobreviveu em El Salvador a um assassino em série, abusos sexuais, ameaças, e sequestros por parte das gangues. Ela se deslocou dentro de seu país para salvar sua vida várias vezes – só em 2015 se mudou três vezes de casa. Hoje, Karla é a voz de muitas mulheres e pessoas trans que sofrem diariamente violência generalizada contra a comunidade LGBTI.
“Não há acesso à educação, moradia, justiça, serviços bancários, oportunidades de emprego para nós. A discriminação e a violência terminam em crimes de ódio cometidos pelos familiares, pelas gangues maras e até pela polícia e os militares”, disse Karla.
O acesso à justiça é mais complicado para as mulheres trans. Durante os cinco anos que duraram um julgamento por sua legítima defesa, quando os maras tentaram assassinar Karla, ela foi presa e submetida a humilhações inimagináveis. “Fui violentada, abusada, espancada com cassetetes todos os dias e me esfaquearam uma vez”, declarou. Após esta experiência na prisão, Karla decidiu envolver-se com o ativismo em prol dos direitos das pessoas trans, especialmente mulheres privadas de liberdade.
Desde 2012, Karla e a ONG COMCAVIS Trans têm registrado casos de pessoas LGBTI que fugiram da violência em El Salvador e foram assistidas com informação antes de sair de seu país. Escapar às vezes não é uma maneira fácil de salvar sua vida. De acordo com o relatório do ACNUR de 2015, Mujeres em Fuga, muitas pessoas LGBTI foram torturadas, violentadas, vítimas dos tráficos de órgãos e de tráfico de pessoas, assaltadas, trapaceadas, sequestradas, e forçadas a prostituição ao longo de suas perigosas viagens. Karla conheceu muitos desses casos: “Ou nos matam ou temos que sair do país. Mas sair não é uma garantia de que nossos direitos sejam respeitados. Não é fácil”.
Rebeca, outra mulher trans, frequentou a universidade em sua cidade natal em El Salvador. Após a graduação, ela começou a trabalhar em um partido político. Seus problemas começaram quando seu chefe não estava feliz com ela pela maneira que se vestia, como caminhava, e ordenou que ela se vestisse como um homem. Rebeca não aceitou suas ordens. Ela queria preservar sua identidade de gênero e não queria mudar quem é. Seu chefe, cúmplice das gangues, decidiu ensinar uma lição a Rebeca. Atiraram nela e a deixaram gravemente ferida. Rebeca conseguiu sobreviver, mas ela sabia que não a deixariam sobreviver da próxima vez. Como muitas outras pessoas LGBTI, ela saiu de El Salvador rumo ao México, onde foi reconhecida como refugiada.
Em 2015, foram registrados 38 crimes de ódio contra a comunidade LGBTI em El Salvador. Deste número, 35 eram mulheres trans. Em Honduras, a comunidade LGBTI e ativistas de direitos humanos registraram em 2016 cerca de 8 crimes de ódio contra pessoas LGBTI, somados aos 228 crimes dos últimos sete anos.
A discriminação e a violência contra pessoas de orientação sexual e/ou identidade de gênero diversa são muito comuns em El Salvador e Honduras. As pessoas pertencentes à comunidade LGBTI são continuamente alvos de ataques e assassinadas pelos maras e outros setores da sociedade, incluindo a polícia e outras autoridades.
Por Francesca Fontanini, Angela Flórez e Mariana Echandi desde Costa Rica, El Salvador y México.