Garoto refugiado sírio sonha em ser jogador de futebol na Alemanha
Garoto refugiado sírio sonha em ser jogador de futebol na Alemanha
Potsdam, Alemanha, 24 de junho de 2016 (ACNUR) – Ahmad tem sete anos de idade e escapou da guerra e do caos na Síria. Agora em segurança, espera se tornar uma estrela internacional do futebol e assiste com atenção os campeonatos europeus para aprender novas técnicas.
Um grande sorriso estampa o rosto de Ahmad Alzaher. Ele olha fixamente para seu pai, Mohammed, que está ajoelhado no campo de futebol, com uma garrafa d’água equilibrada em sua cabeça. Ahmad então dá alguns passos para trás e corre para chutar a bola com seu potente pé esquerdo, almejando a garrafa.
Algumas curiosas garotas alemãs, de fora do campo, comentam e se arrepiam de emoção enquanto a bola viaja a toda velocidade pelo ar. E logo começam a aplaudir quando a bola derruba a garrafa da cabeça de seu pai. Ahmad corre para festejar, colocando seus braços sobre sua cabeça em um salto com giros, no estilo de Cristiano Ronaldo.
O malabarismo impecável é apenas um dos muitos que pai e filho praticam juntos todas as tardes depois da escola. Ambos têm grandes esperanças de que algum dia seu árduo trabalho será recompensado e que as habilidades de Ahmad chamarão a atenção de um grande clube europeu.
“Meu jogador favorito é o Cristiano Ronaldo porque ele é o melhor e o mais rápido”, conta Ahmad ao ACNUR, referindo-se ao mais famoso jogador de futebol português. “Eu também sou rápido. Meu sonho é conhecer o Ronaldo algum dia e jogar futebol com ele”.
“Nós dois esperamos ansiosos a Eurocopa 2016”, disse seu pai. “Torceremos para Alemanha. Será difícil para eles, mas temos fé na Alemanha, esta seleção pode ser campeã. O melhor do futebol, de desse ano pela Eurocopa em especial, é que este é um esporte que une as pessoas. Durante noventa minutos, todos estão juntos, sem distinção de ideologia, religião ou cultura”.
“A Euro 2016 é como a Copa do Mundo”, acrescenta Ahmad. “É igualmente importante e tão legal quanto, é fantástica”.
Foram os grandes sonhos de Ahmad que incentivaram seu pai, um ex-goleiro, a deixar para trás seu lar em Jableh, uma cidade costeira ao noroeste da Síria. “Eu deixei o país pelo Ahmad”, disse Mahammed, de 39 anos. “Quando eclodiu a guerra me dei conta que não havia um futuro para ele na Síria. Não sabia quanto tempo duraria o conflito. Ele estava a caminho de se tornar um atleta e não sobraria nada para ele. Pensei que, pelo grande talento que tem, ele precisa de treinamento adequado”.
Mohammed disse que seu mundo mudou quando Ahmad nasceu, e que o talento de seu pequeno filho era visível desde o momento que ele conseguiu ficar de pé.
“Ahmad começou a jogar futebol logo que começou a caminhar”, disse. “Notei desde o início que amava futebol e que se sentia em casa dentro do campo. Não era como os outros meninos com este esporte. Ele queria chutar a bola e fazer gols, ele simplesmente jogava por prazer.”
Um dia, quando Ahmad tinha apenas quatro anos, Mohammed o levou a um jogo da liga síria. Para surpresa da multidão, Ahmad foi ao campo e começou a mostrar seu talento. “Todos estavam tão entusiasmados e impressionados com ele”, lembra seu pai. “Os melhores jogadores sírios esperavam um futuro maravilhoso para ele internacionalmente”.
Mas a medida que os anos passaram e seu país seguia em guerra, Mohammed começou a perder as esperanças que as coisas voltariam a normalidade. “Vejo as notícias da Síria e meu coração sofre”, disse. “Se Deus quiser, esta guerra terminará e a Síria progredirá. Todos os sírios são meus irmãos e irmãs. Rezo para que toda a situação melhore em meu país”.
Em outubro do ano passado, Mohammed, sua esposa Afaf e sua irmã Zahra decidiram levar Ahmad ao Líbano e então para a Turquia. Pediu dinheiro emprestado para pagar os contrabandistas, mas nem todo o dinheiro do mundo os levaria com segurança à Grécia. Assim como muitos outros barcos, o que estava falhou no meio do caminho, no Mar Egeu.
“Estávamos na metade do caminho quando o motor estragou”, lembra Mohammed. “Tentamos seguir, mas a uma distância curta da costa grega, começamos a afundar. Por um momento, pensei que tudo estava perdido. Mas havia outro barco a nossa frente, também cheio de refugiados. Eles voltaram para nos ajudar e todos conseguimos chegar a terra firme. Ainda não consigo acreditar que nos salvamos, que sobrevivemos ao mar”.
Na Grécia, Ahmad e sua família seguiram a rota dos países dos Balcãs, contornando a Hungria, a Eslovênia e então a Áustria. No início de novembro, a polícia os encontrou enquanto cruzavam a pé a fronteira da Alemanha e então foram levados de ônibus até um albergue em Potsdam, cidade ao sudoeste de Berlim.
“Não sabíamos para onde estávamos indo. Só sabíamos que era lugar melhor”, disse Mohammed. “Depois de uma viagem como esta, foi incrível chegar ao destino. Estava tão aliviado. Quase não dormi por 15 dias, ficando acordado enquanto os outros dormiam para manter a guarda, e cuidar de todos. Sempre temi por meu filho. Quando chegamos, me dei conta: agora estou seguro, minha família está segura”.
Ahmad e sua família são agora refugiados na Alemanha. Em janeiro, mudaram-se para um apartamento de três quartos, alugado em Potsdam. O garoto está se ajustando muito bem a sua nova realidade, ele vai bem no colégio e joga na equipe de futebol de meninos da sua idade. A vida é mais difícil para os adultos. Mohammed está aprendendo alemão, enquanto Zahra, a tia de Ahmad, de 29 anos, está se capacitando outra vez, com a esperança de continuar seu trabalho anterior como professora.
“Na Alemanha, temos uma vida nova”, disse Mohammed. “Devemos nos acostumar a isso e temos que reconstruir nossas vidas desde o começo”.
“Estou aprendendo rápido a falar alemão, mas os adultos são lentos”, acrescenta Ahmad. “Às vezes minha família me diz em árabe e eu respondo em alemão e eles não me entendem. Eu gosto da escola. Minhas matérias preferidas são alemão e educação física. Meu professor de alemão faz com que aprendizagem seja muito fácil e divertido; aprendemos a fazer coisas e desenhar. Ele está contente por mim porque já sei escrever um pouco”.
Ahmad se mostra indiferente a ausência de outras crianças sírias em seu colégio; suas habilidades de futebol já lhe transforam em um menino popular. “Todas as crianças na minha sala de aula são minhas amigas”, disse. “Tudo é novo aqui. Penso em ir à Síria. Para ver minha casa, para jogar com meus amigos e depois voltar à Alemanha. Desejo que as crianças na Síria estejam felizes e seguras. Jogo futebol todos os dias e isso me faz feliz”.