São Paulo: Integração de refugiadas passa pelo trabalho
São Paulo: Integração de refugiadas passa pelo trabalho
SÃO PAULO, Brasil, 12 de fevereiro de 2016 (ACNUR) - A Gesplan é uma pequena empresa de assessoria contábil de São Paulo. Com apenas 30 funcionários, vem demonstrando abertura para a contratação de refugiados. Atualmente conta com três estrangeiros, ou 10% de seu quadro, sendo dois africanos – um funcionário da Nigéria e outra de Guiné-Conacri – e Hayat, uma jovem síria de 22 anos. “Inicialmente o nome ‘refugiados’ assusta, pois é como se eles estivessem fugindo, mas vimos que era plenamente possível contratá-los. São pessoas com muita capacitação e que falam vários idiomas. Nossa empresa é pequena, imagina isso em uma multinacional?”, relata o diretor da Gesplan, Mauro de Andrade.
O depoimento de Mauro fez parte do segundo encontro do projeto "Empoderando Refugiadas", promovido pela Rede Brasileira do Pacto Global da ONU no dia 4 de fevereiro na sede da ONG Mulheres do Brasil, em São Paulo, em parceria com a ONU Mulheres, Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), Programa de Apoio para a Recolocação dos Refugiados (PARR), Caritas e Fox Time e apoio das Lojas Renner. A proposta foi sensibilizar a área de recursos humanos das empresas para a contratação de refugiadas e refugiados no Brasil e contou também com a participação de representantes da sociedade civil organizada e poder público. Além disso, uma oficina foi promovida com refugiadas de países da África e Ásia, que puderam ter lições introdutórias de língua portuguesa e finanças pessoais.
De acordo com o Assistente de Proteção da Agência da ONU para os Refugiados (ACNUR), Vinícius Feitosa, o Brasil tem hoje 9 mil pessoas em situação de refúgio, forçadas a abandonar seu país de origem por “fundado temor de perseguição”, seja por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou participação em grupos sociais, o que caracteriza uma violação generalizada de direitos humanos. “Diante dessa situação, eles precisam da garantia de proteção do Estado brasileiro. Portanto, ao receberem o protocolo provisório de refúgio (foto abaixo), já conseguem ter acesso ao CPF e carteira de trabalho e podem ser contratados”, afirmou.
Coordenadora do Grupo Temático de Direitos Humanos da Rede Brasileira do Pacto Global, a assessora de responsabilidade social da Itaipu Binacional, Heloísa Covolan, destacou que o principal objetivo é sensibilizar as empresas sobre o impacto que a violação de direitos humanos acarreta aos negócios. “O setor privado é o grande promotor das violações. E a contratação de refugiadas e refugiados mostra sensibilidade das empresas brasileiras para uma causa nobre, que inclusive será mostrada como case de sucesso na sede da ONU em Nova York, em março”.
Sobre a questão de gênero, a assessora da ONU Mulheres, Adriana Carvalho, lembrou dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), - ratificados pelos 193 países-membros da ONU em setembro de 2015, sendo o ODS 5 específico para “alcançar igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas”. Ela também convidou as empresas para que assinem os Princípios de Empoderamento das Mulheres (Women’s Empowerment Principles - WEPs), uma parceria da ONU Mulheres com o Pacto Global da ONU. Vinícius Feitosa ainda comentou que as refugiadas – que correspondem a 30% das pessoas em situação de refúgio no Brasil – são um público mais vulnerável, uma vez que podem ser vítimas de preconceito de gênero e violência sexual.
Coaching
Signatária do Pacto Global desde 2013, a Fox Time vem participando ativamente do Empoderando Refugiadas. Após receber a primeira reunião do projeto em 4 novembro de 2015, a empresa de recursos humanos vem fazendo sessões de coaching com refugiadas. Segundo a responsável pela gestão estratégica da empresa, Maressa Bernardo, é feita uma orientação sobre o Brasil e o mercado de trabalho. “As histórias são muito emocionantes. Elas são muito qualificadas e só estão esperando uma oportunidade”, disse.
“Essa história de que eles ‘roubam’ emprego de brasileiros é uma ignorância. Com o conhecimento que têm, os refugiados e imigrantes acabam movimentando o mercado e trazendo emprego para todos”, completou Mauro de Andrade, diretor da Gesplan.
Em parceria com a escola de idiomas Language Land, as refugiadas tiveram lições de português e receberam o livro didático Pode Entrar, produzido pelo Curso Popular Mafalda em parceria com o ACNUR e Caritas Arquidiocesana de São Paulo, destinado ao aprendizado da língua portuguesa para refugiadas e refugiados. Durante o almoço, refugiadas e empregadores tiveram a chance de se conhecer e conversar.
Integração no Brasil
Nkechinyere Jonathan, professora de 45 anos (no detalhe da foto acima), deixou Lagos, capital da Nigéria, na África Ocidental, para viver dignamente no Brasil. No entanto, a refugiada tem tido dificuldades de conseguir um trabalho. Desempregada, ela tem feito entrevistas e aguarda uma resposta positiva, especialmente em sua área de atuação. “Iniciativas como esta são muito frutíferas, pois obtenho informações sobre o que o mercado de trabalho espera de mim”, disse.
“Eu estou gostando muito do projeto, pois nos ajuda a crescer. Sou refugiada, tenho filhos e as informações ajudam a me defender. Deixei um pouco a cultura do meu país para saber mais sobre o Brasil e fazer novos amigos e contatos profissionais”, contou Prudence Kalambay, 35, que veio da República Democrática do Congo e trabalha como atendente em uma unidade das Lojas Marisa.
Há pouco mais de dois anos morando em São Paulo, a professora de idiomas síria Dana Al Balkhi, 27, comentou que as orientações dadas durante a oficina abrem caminhos para uma vida plena no país. “Depois da aula de educação financeira, pude conhecer melhor como controlar as finanças, pois há muitas diferenças entre os países. Na Síria eu não tinha conta bancária nem cartão de crédito, o que no Brasil é importante para o meu planejamento financeiro e meu futuro”.
Participaram do evento representantes das seguintes empresas: Lojas Renner, Mattos Filho Advogados, Sodexo, Dry Up, Ambev, Projeto RH e Gesplan.
Por Luiz Fernando Campos (Pacto Global), de São Paulo.