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Violência das gangues aumenta e mais salvadorenhos são forçados a deixar o país

Comunicados à imprensa

Violência das gangues aumenta e mais salvadorenhos são forçados a deixar o país

Violência das gangues aumenta e mais salvadorenhos são forçados a deixar o paísDepois de sofrer frequentes ameaças por membros de gangues para o pagamento semanal por sua proteção, o motorista salvadorenho Javier apresentou uma queixa à polícia.
3 Fevereiro 2016

CIDADE DA GUATEMALA, Guatemala, 04 de fevereiro (ACNUR) – Depois de sofrer frequentes ameaças por membros de gangues para o pagamento semanal de trinta dólares por sua proteção, quantia que ele mal podia pagar, o motorista salvadorenho Javier apresentou uma queixa à polícia.

Chefe de família com duas filhas adolescentes, ele se lembra de acordar às três horas da manhã no dia seguinte com um nó no estômago de tanto medo. A caminhada de seis bloco para chegar ao trabalho, na estação central de ônibus em São Salvador, parecia uma eternidade, pois temia uma represália violenta.

"Quando prestei queixa, eles vieram ao meu local de trabalho atiraram duas vezes próximo ao meu olho", Javier* recorda segurando as lágrimas de raiva e desespero. "Eu consegui chegar até o hospital, mas quando eu larguei meu emprego, eles me avisaram que para continuar vivo, era melhor eu desaparecer imediatamente".

O tormento da família ainda não havia terminado. A filha de Javier, em idade escolar, que já havia sido assediada, foi estuprada por um membro da gangue e engravidou.  Ela não conseguiria se esconder dos criminosos dentro de El Salvador. "Nós não tivemos outra opção senão fugir. Era impossível ir para qualquer outra parte do país", diz ele.

Essa família é apenas uma entre um crescente número de pessoas, de diferentes faixas etárias, que está fugindo da violência descontrolada cometida pelas gangues de El Salvador, considerado atualmente o país mais perigoso das Américas.

Desde o término da trégua entre o Governo de El Salvador e os "maras", como são conhecidas as gangues de rua, em 2014, a violência cresceu abruptamente. A taxa nacional de homicídios chegou a 104 assassinatos a cada 100.000 pessoas - a maior desde sangrenta guerra civil do país que terminou em 1992.

A família busca agora refúgio na Guatemala, onde atualmente vivem em um quarto individual, na capital. Enquanto isso, Javier continua com medo dos maras, cujo alcance é internacional: "Eu não confio em ninguém", diz ele, "eu só confio em Deus e em minhas filhas".

A fuga motivada pelos atos de violência está se tornando cada vez mais comum em El Salvador, onde as atividades criminosas das quadrilhas incluem assassinatos, extorsões, sequestros, estupros, e agora afetam pessoas de diversas classes sociais. As vítimas vão desde crianças em idade escolar e motoristas de ônibus até os empresários, policiais e suas famílias, deixando um número crescente de pessoas sem outra opção senão fugir, segundo o ACNUR, a Agência da ONU para Refugiados.

"Qualquer um pode ser alvo das maras: um menino voltando da escola para casa, uma família que tem um pequeno estabelecimento no bairro, ou o primo de um agente policial. A cada esquina, vidas são destruídas devido a homicídios, lutas entre gangues pelo controle de territórios, fronteiras invisíveis que não devem ser cruzadas, recrutamento forçado, estupro e agressões sexuais, aumento de taxas de extorsão e ameaças", disse Fernando Protti, Representante Regional do ACNUR para a América Central, sobre o cenário que a cada dia se torna mais grave.

"A situação só está piorando. Em 2015, a taxa de homicídios ultrapassou a taxa de assassinatos ocorridos durante a guerra civil do país. El Salvador é agora considerado o país mais violento do continente", acrescentou.

De acordo com números do ACNUR, solicitações de refúgio feitas por cidadãos salvadorenhos na Guatemala quase duplicou entre 2013 e 2014, um aumento de 172%. Os salvadorenhos também estão fugindo para outros países da região, como os Estados Unidos e México, onde as solicitações quadruplicaram e triplicaram, respectivamente, desde 2010.

Entre as milhares de pessoas que recentemente fugiram para salvar suas vidas, está a empresária Caterina*, cuja família possuía um supermercado rentável em um bairro de São Salvador. O estabelecimento chamou a atenção dos maras, e os membros da gangue exigiram uma fatia de seus lucros, elevando o montante a cada semana até que o pagamento se tornou insustentável.

"Nós pensamos em vender o mercado, mas a quadrilha não permitiria isso, já que o negócio era bem-sucedido. Chegamos a um ponto em que a situação se tornou insustentável. Tivemos que vender a nossa casa", disse ela.

Quando, depois de meses de extorsão, a família se viu incapaz de pagar os valores demandados, a quadrilha matou um parente. Além disso, a filha adolescente de Caterina foi perseguida pela gangue que tentou aliciá-la. Quando ela se recusou, eles enviaram fotografias da casa de sua família para assustá-la. Por fim, os "mareros" (como os gangsters são conhecidas em espanhol) passaram a persegui-la em sua escola.

"Foi nesse momento que eu disse que não aguentava mais. Falei com meu marido e decidimos deixar o país", diz Caterina. "Você não poderia visitar outro bairro, porque se fosse visto na área de um mara diferente, eles acabariam te matando, sem pestanejar. E se você não paga a extorsão, eles te matam também. Portanto, não há saída", acrescentou ela.

Ela percebe nitidamente o aumento do impacto do terror provocado pelas gangues, que, apesar da presença policial, controlam diversas áreas nas cidades de El Salvador e cujo alcance estende-se aos países vizinhos.

"Isso nos transtorna, é como se fôssemos invisíveis gritando em silêncio", diz ela, claramente incomodada ao pensar naqueles que deixou para trás. "Todos os dias quando lemos as notícias, percebemos que a situação não está melhorando e lembramos que parte de nossa família ainda vive lá."

Por Francesca Fontanini em Guatemala City, Guatemala

* Nomes que foram trocados por questões de segurança.