ACNUR defende garantias para refugiados e apátridas em nova lei migratória do Brasil
ACNUR defende garantias para refugiados e apátridas em nova lei migratória do Brasil
Brasília, 29 de outubro de 2015 (ACNUR) – Durante debate na Câmara de Deputados, o representante interino do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR) no Brasil, Agni Castro-Pita, defendeu que a nova lei migratória brasileira inclua mecanismos de proteção a refugiados e apátridas. O ACNUR recomendou que estes mecanismos garantam a estes indivíduos o acesso aos direitos internacionalmente reconhecidos nos tratados internacionais e regionais de direitos humanos.
“As normas migratórias, que abordam princípios e garantias relativas aos migrantes em geral, estendem sua aplicabilidade a especificidades vinculadas à proteção dos refugiados e dos apátridas. Por isso, o ACNUR defende que a nova legislação migratória brasileira seja compatível com os institutos de proteção a estes grupos que estão sob o mandato do Alto Comissariado”, disse Castro-Pita, durante audiência pública promovida pela Comissão Especial que analisa o projeto de lei 2516/15, que institui a nova Lei de Migração do país.
Segundo Castro-Pita, ao incluir mecanismos de proteção a refugiados e apátridas em sua nova lei migratória, o Brasil internalizará os compromissos assumidos internacionalmente na defesa dos direitos humanos, especialmente das populações sob o mandato do ACNUR.
A deputada Bruna Furlan (PSDB-SP), presidente da Comissão Especial que analisa o projeto da Lei de Migração, parabenizou o ACNUR pelas sugestões e pediu que as propostas sejam encaminhadas formalmente para que sejam consideradas na nova versão do projeto de lei. A proposta da Comissão deverá ser votada até o final deste ano. O projeto, já aprovado no Senado Federal, tramita em regime de prioridade, e deve ser analisado também pelo Plenário.
O chefe da Unidade de Proteção do ACNUR no Brasil, Gabriel Godoy, também falou aos integrantes da Comissão Especial e defendeu especial atenção às crianças estrangeiras desacompanhadas ou separadas dos responsáveis que chegam ao país. Ele argumentou que a nomeação de um responsável por essas crianças estrangeiras desacompanhadas costuma ser um processo burocrático e demorado, comprometendo o acesso delas aos mecanismos de refúgio.
“A nova lei migratória deve incorporar o princípio do superior interesse da criança e acelerar a nomeação de responsáveis legais para não impedir o acesso aos mecanismos de proteção internacional”, comentou Godoy
Em sua intervenção, Godoy alertou para dispositivos do projeto que restringem direitos de estrangeiros e sugeriu que sejam retirados do texto. Ele mencionou que o texto em discussão na Câmara dos Deputados impede que “estrangeiros visitantes” tenham livre acesso à justiça. “Isso pode prejudicar a situação de um estrangeiro apátrida ou em situação de refúgio, pois muitos entram no país na condição de visitante e podem ter que se valer da Justiça para garantir seus direitos, no âmbito da proteção internacional”.
Além disso, Godoy propôs que o texto incorpore procedimento administrativo de determinação da condição de apátrida, acelerando e simplificando a concessão de naturalização para esses estrangeiros sem nacionalidade. O funcionário do ACNUR defendeu ainda que a nova lei migratória do país garanta a refugiados e apátridas o acesso a políticas públicas em condição de igualdade com os residentes do País. "O projeto supera o ranço de segurança nacional do antigo Estatuto do Estrangeiro", destacou o chefe da Unidade de Proteção do ACNUR no Brasil.
"Sugerimos que o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE) seja o órgão da administração brasileira a fazer essa atividade de proteção e garantir que essa população tenha acesso facilitado à naturalização. E já não se deve falar mais de criminalização da circulação indocumentada ou irregular, até porque no caso dos refugiados o ingresso indocumentado ou com documento falso é, muitas vezes, a única maneira de se deixar uma zona de conflito. É o que nós estamos vendo com muitos refugiados sírios que têm buscado o Brasil para reconstruir suas vidas", ressaltou Gabriel Godoy.
O defensor público de São Paulo Daniel Chiaretti, que atua com imigrantes, também sugeriu que artigos que restringem o acesso à Justiça e a direitos trabalhistas daqueles imigrantes ainda não regularizados sejam excluídos do texto.
"A classificação de imigrantes indocumentados como ilegais, retirando deles alguma série de direitos, funda-se na ideia do estrangeiro como inimigo, como alguém que está colocando em risco valores fundamentais do Estado. Mas em geral, em regra, esses temores são infundados. A ideia de que estrangeiros cometem crimes no Brasil ou que vêm aqui roubar empregos são todas questões que empiricamente têm sido afastadas. No nosso dia-a-dia, na nossa atuação, nós vemos cada vez mais que isso não faz o menor sentido."
Durante a audiência pública na Câmara dos Deputados, o ACNUR defendeu ainda que a nova lei migratória do Brasil estabeleça mecanismos de proteção complementar para os estrangeiros que não se enquadrem na categoria de refúgio ou apatridia, apresentando uma resposta ampla às situações de deslocamento forçado por fenômenos naturais extremos e decorrentes do aquecimento global, como também violação de direitos econômicos, culturais e sociais.
Segundo dados do Comitê Nacional para Refugiados, o Brasil possui cerca de 8.500 estrangeiros reconhecidos como refugiados, além de aproximadamente 12 mil solicitações pendentes de análise por parte do CONARE.
Por Luiz Fernando Godinho, de Brasília.