Crianças da América Central enfrentam caminho árduo em busca de segurança
Crianças da América Central enfrentam caminho árduo em busca de segurança
LA TÉCNICA, Guatemala, 20 de dezembro de 2016 (ACNUR) – Carlos, de nove anos de idade, e Susana, de quatro, aguardam sentados às margens do rio Usumacinta, na Guatemala, ao lado de seu pai, Gerónimo Vázquez*, observando as águas do rio em direção ao México, para onde partirão sem documentos à tarde.
Vázquez trabalhava como policial em El Salvador, seu país natal, e se envolveu em um tiroteio no qual morreu um integrante de uma gangue. Como vingança, os membros do bando alvejaram a casa de sua família.
No dia seguinte, Vázquez partiu para os Estados Unidos com sua mulher e seus filhos em uma desesperada viagem por terra em busca de segurança, o que, segundo ele, está sendo especialmente difícil para sua família.
“É difícil para as crianças. Elas não entendem o que está acontecendo, mas não podíamos deixá-las em casa com toda essa violência”, diz Vázquez, levantando sua filha. “É melhor que elas venham conosco, mesmo este sendo um árduo caminho”.
"Não podíamos deixá-las em casa com toda essa violência”.
No ano passado, cerca de 110 mil pessoas fugiram da ação de gangues e de outros tipos de violência nos países do chamado Triângulo Norte da América Central, região que compreende a Guatemala, El Salvador e Honduras, procurando refúgio em países estrangeiros. O número é cinco vezes maior em relação ao registrado no ano de 2011, segundo dados do ACNUR, a Agência da ONU para Refugiados.
A maior parte das pessoas procura proteção nos Estados Unidos e no México, embora o número real de indivíduos que deixam suas casas é muito maior, visto que muitos partem sem documentação e não apresentam pedidos formais de refúgio por falta de informação ou por medo de serem detidos ou deportados.
Entre os que enfrentam diversos perigos no caminho em direção ao norte, há um número cada vez maior de crianças. Além dos perigos físicos que enfrentam ao cruzar rios fronteiriços, selvas e desertos, essas crianças também correm o risco de serem sequestradas por criminosos ligados aos cartéis de drogas e são extremamente vulneráveis a abusos sexuais. Outros jovens caem nas mãos de traficantes de pessoas, cuja única preocupação é o lucro financeiro.
Somente em um desordenado assentamento fronteiriço no norte da Guatemala, entre 300 a 400 pessoas arriscam-se diariamente na difícil viagem em direção ao México pelo rio. Segundo um funcionário da Cruz Vermelha Guatemalteca, muitos pagam 150 quetzal – cerca de 20 dólares – para cruzar o rio em um barco a remo, evitando os postos fronteiriços.
Estima-se que, a cada quatro pessoas que partem em direção ao norte, uma é menor de idade. Embora alguns menores partam acompanhados de seus pais, como Carlos e Susana, outros fazem a viagem completamente sozinhos.
“É assustador. Quando você segue por este caminho sabe que está colocando a sua vida em grande perigo”, diz Rodrigo Barrera*, de 17 anos, que fugiu de Honduras por causa da violência das gangues, chegando a La Técnica, Guatemala, sem um centavo no bolso.
"Você sabe que está colocando a sua vida em grande perigo”.
Assim como muitos menores desacompanhados, Rodrigo não tem ideia do caminho que vai seguir, onde ficará ou como reagirá caso seja detido pela polícia.
A violência no Triângulo Norte atingiu níveis nunca vistos. Com frequência, aqueles que fogem em busca de um lugar seguro levam seus filhos pequenos. Durante essa árdua viagem, as crianças são obrigadas a enfrentar a fome e o cansaço, descansando em ônibus, trens, motéis, albergues ou no mato, segundo trabalhadores humanitários.
Na unidade da Cruz Vermelha Guatemalteca situada na região, a paramédica Miriam Castañeda atende a crianças com quadros de diarreia, febre, tosse e desnutrição. Castañeda afirma que frequentemente as famílias se veem obrigadas a recorrerem aos chamados coiotes, ou traficantes humanos, que cobram cerca de 6.500 dólares para levar centro-americanos aos Estados Unidos sem documentos. Esses coiotes obrigam os grupos a seguir viagem, mesmo se uma criança estiver doente.
Abraham Suyen, que trabalha para a Igreja Católica em prol dos migrantes e refugiados na região, afirma que os danos psicológicos costumam ser mais severos entre as crianças que se deslocam.
“Há crianças que foram forçadas a fugir de seus lares, e elas partem chorando, desesperadas, estressadas e com medo de serem sequestradas”, diz Suyen. “É um trauma que as marcará para o resto da vida”.