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A coisa mais importante

Comunicados à imprensa

A coisa mais importante

30 May 2019

Alguns fugiram sem nenhum tipo de preparo. Outros tiveram semanas ou meses para ansiosamente analisar as opções – até que o perigo crescente finalmente os forçou a deixar suas casas.


Nos últimos sete anos, o ACNUR trabalhou com o fotógrafo Brian Sokol em um projeto de retratos de refugiados chamado A Coisa Mais Importante. Por meio de imagens e entrevistas, é revelada um pouco da angustiada decisão que famílias refugiadas enfrentam quando são forçadas a fugir de suas casas.

As coisas que eles levaram consigo mostram elementos de suas vidas e culturas – e fornece evidências sobre as circunstâncias em que eles fugiram. Os sudaneses retratados aqui priorizam objetos que os ajudariam a se manter vivos durante sua difícil jornada em busca de segurança: uma panela, um machado, uma garrafa de água, uma cesta. Para os Sírios, os objetos eram principalmente sentimentais: um anel antigo, uma fotografia rasgada, a chave de uma porta que talvez não exista mais.

Aqueles que fugiram do Mali geralmente levaram objetos que refletem sua identidade cultural, enquanto os da República Centro-Africana apresentaram a tendência de levar objetos práticos, como uma máquina de costura ou um par de muletas. Muitos dos angolanos que estão se preparando para voltar para casa ainda têm os itens com os quais fugiram – alguns há mais de 50 anos.

Até o momento, mais de 60 refugiados de seis diferentes países participaram deste projeto. A seleção abaixo apresenta nove deles. Enquanto essas impressionantes imagens iluminam as experiências de pessoas forçadas a fugir, elas também desafiam os espectadores a pensarem sobre  o que eles levariam consigo se tivessem que fazer uma viagem tão perigosa.

“Isso traz um pouco de alívio de minhas tristezas”.

 

Omar segura um buzuq, ou alaúde de pescoço comprido – a coisa mais importante que ele conseguiu levar para o campo de refugiados de Domiz, na região do Curdistão, no Iraque. Omar decidiu que era a hora de deixar sua casa em Damasco, a capital síria, na noite em que seus vizinhos foram assassinados. “Os assassinos, seja lá quem fossem, vieram para a casa deles e cortaram selvagemente meu vizinho e seus dois filhos”, lembra ele. Omar diz que tocar o buzuq “me enche de nostalgia e me faz lembrar da minha pátria. Por um curto período, isso me traz algum alívio de minhas tristezas”.

Para ajudar seus filhos a alcançar a segurança, essa jovem mãe teve que lidar com um ato de equilíbrio.

 

Vários meses antes dessa imagem, frequentes bombardeios forçaram Dowla e seus seis filhos a fugirem de sua vila no estado de Blue Nile, no Sudão. O objeto mais importante que ela conseguiu trazer é o poste de madeira equilibrado sobre o ombro. Ela o usou para transportar seus seis filhos durante a jornada de 10 dias até o campo de refugiados de Doro, no condado de Maban, no sul do Sudão. Às vezes, as crianças estavam cansadas demais para andar, obrigando-a a carregar duas de cada lado.

Duas rodas e um tanque de gasolina levaram Abdou para a segurança.

A família de Abdou fugiu do Mali depois que sua mãe e quatro outras mulheres foram sequestradas, levadas para o deserto e baleadas. Quando Abdou soube do que aconteceu, ele esperou até anoitecer e escapou com sua esposa e dois filhos para o deserto. Ele retornou para enterrar sua mãe alguns dias depois. A coisa mais importante que Abdou levou com ele foi a motocicleta em que ele está sentado nesse retrato de família, tirado em março de 2013 ao lado de fora do abrigo no campo de refugiados de Mentao, em Burkina Faso. Depois de enterrar sua mãe, Abdou colocou sua mulher e filhos em um carro e ele e seu pai seguiram na moto, que ele diz que salvou suas vidas.

“Foi um presente do meu pastor no dia do meu batismo”.

Elizabeth diz que sua Bíblia é a coisa mais importante que trouxe consigo quando fugiu da guerra na Angola. É a única coisa que ela tem daquela jornada de 52 anos atrás. “Foi um presente do meu pastor no dia do meu batismo”, diz ela. Apesar de ela ter encontrado segurança no país agora chamado de República Democrática do Congo (RDC), viver no exilio tem sido difícil. A mãe de sete crianças está separada por anos de vários membros de sua família e luta contra o sentimento de que ela não tem uma casa realmente. “Nesse mundo, coisas ruins acontecem, mas na Bíblia você pode encontrar palavras que te ajudam”.

“A cabra me traz esperança”.

 

Aboubacar deixou o Mali com sua esposa e dois filhos em uma carroça de burro, levando consigo uma única cabra. Ele diz que, além das roupas que ele estava usando e um pouco de dinheiro, a cabra era a única coisa que ele não poderia deixar para trás. Isso o lembrou de todas as coisas que ele havia trabalhado duro para adquirir de volta para casa. “A cabra me traz esperança, alegria e uma sensação de que as coisas podem mudar para melhor”, disse Aboubacar, que foi fotografado com sua família perto de seu abrigo no campo de refugiados de Goudebou, em Burkina Faso. Ele também espera que o animal sinalize para os outros que ele era um homem que tinha uma boa condição no Mali.

Esta panela era pequena o suficiente para carregar e grande o suficiente para alimentar sua família.

Magboola e sua família resistiram a ataques aéreos por vários meses, mas decidiram que era hora de deixar sua aldeia de Bofe, no estado do Blue Nile, no Sudão, na noite em que os soldados chegaram e abriram fogo. Com suas três filhas, ela viajou por 12 dias de Bofe para a cidade de El Fudj, na fronteira do Sudão do Sul. A coisa mais importante que ela foi capaz de levar com ela é a panela que ela segura nessa fotografia, tirada no campo de refugiados de Jama, no condado de Maban, no Sudão do Sul. Era pequena o suficiente para poder viajar com ela, e grande o suficiente para cozinhar o sorgo para si e para suas três filhas durante a jornada.

“Enquanto eu o tiver comigo, estou conectada com Deus”.

 

Iman – aqui com seu filho Ahmed e sua filha Aishia, no campo de refugiados de Nizip, na Turquia – deixou sua casa em Aleppo depois de meses de conflito. Ela sentiu que tinha que fugir quando ouviu relatos de soldados assediando sexualmente as mulheres de sua cidade. A jornada da Síria para a Turquia foi cheia de perigos, e Iman perdeu cinco familiares. A coisa mais importante que ela conseguiu levar com ela é o Alcorão que ela segura nessa fotografia. Ela diz que o Alcorão inspira uma sensação de proteção. “Enquanto eu o tiver comigo, estou conectada com Deus”.

“Quero estudar para que eu possa me tornar alguém”.

 

Fideline segura um dos livros escolares que ela conseguiu salvar quando ela e sua família fugiram para salvar suas vidas e embarcaram em um barco para atravessar o rio Oubangi da República Central Africana para Batanga, na República Democrática do Congo. A gota d'água foi quando a adolescente e suas amigas viram um empresário ser sumariamente executado. Fideline se lembra de gritar enquanto corria para casa. Seu pai decidiu que eles tinham que sair imediatamente. "Eu não podia levar minha mochila escolar, meus sapatos ou as fitas coloridas para o meu cabelo, mas trouxe meus cadernos e minha caneta", diz a dedicada estudante. “Sofremos muito”, diz ela, acrescentado: “Eu quero estudar para que eu possa me tornar alguém”.

“Meu pai me deu seu paletó para me manter aquecido”.

 

Sebastian tinha sete anos na noite em que sua família, que fugiu da guerra da independência da Angola, chegou no país agora conhecido como República Democrática do Congo. Quase 60 anos depois, ele lembra, “estava frio, e meu pai me deu seu paletó para e manter aquecido. Eu estava vestindo-a quando cruzamos a fronteira. Quando vejo esse paletó, até mesmo agora enquanto estamos falando sobre isso, penso sobre a Angola. O dia que eu puder voltar para a Angola, vou vestir esse paletó e vou lembrar de meu pai. Vou vestir porque agora eu também sou um pai”.