Com apoio do ACNUR, refugiados e migrantes da Venezuela concluem capacitação profissional no Distrito Federal
Com apoio do ACNUR, refugiados e migrantes da Venezuela concluem capacitação profissional no Distrito Federal
No entanto, no país de acolhida, as relações de trabalho e a legislação são diferentes, as instituições onde você estudou são desconhecidas, e o acesso às suas referências profissionais fica difícil. E você ainda precisa encontrar formas de recomeçar a sua vida com a dignidade que deseja, contribuindo para a comunidade que acolhe a sua família.
Parte das pessoas refugiadas e migrantes da Venezuela que residem no Brasil enfrenta esta realidade, e têm o apoio da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e organizações parceiras para diminuir estes obstáculos.
Um bom exemplo vem acontecendo na comunidade de São Sebastião, no Distrito Federal, com um grupo de 14 pessoas da Venezuela. Nos últimos dois meses, eles participaram do curso “Atendimento e Vendas: Ferramentas e Estratégias”, do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), concluído com sucesso na última terça-feira (30).
O ACNUR ofereceu o curso a partir de uma solicitação da própria comunidade, como parte da iniciativa de Proteção de Base Comunitária mantida na região – que, entre outros objetivos, procura fazer com que as comunidades de pessoas refugiadas identifiquem suas demandas de proteção e integração e atuem proativamente para atendê-las.
“Com apoio do ACNUR, a comunidade venezuelana em São Sebastião fez um processo de escuta coletiva e entendeu que eram necessários cursos de capacitação profissional para melhorar o acesso a postos de trabalho, inclusive no comércio local que também atende às demandas dos próprios consumidores venezuelanos na região, com menos barreiras culturais. O curso certificado pelo Senac, referência em educação profissional no país, deixa o currículo destas pessoas ainda mais atrativo”, afirma Paulo Sergio de Almeida, oficial de Meios de Vida do ACNUR.
A Agência da ONU para Refugiados adota outras iniciativas para engajar o setor privado e incluir esta população no mercado de trabalho, como as plataformas Empresas com Refugiados e Refugiados Empreendedores.
Formatura e empregos
Para comemorar a conquista, na mesma sala em que tiveram todas as aulas, cedida pela Assembleia de Deus da Missão Shekinah, os alunos confraternizaram comendo cachapas e empanadas típicas da Venezuela e as tradicionais coxinhas e empadas brasileiras.
Um dos mais celebrados na noite da formatura foi o professor do Eixo de Gestão e Negócios do Senac no DF, Osmany Miranda Teixeira, que conduziu o curso. Disputado para fotos e abraços, o professor fez um poema ressaltando as qualidades de cada aluno e aluna na hora da entrega dos certificados.
Osmany relata que, no início do curso, as maiores dificuldades foram o entendimento da língua portuguesa, os atrasos e o cansaço – alguns trabalhavam o dia todo e à noite assistiam às aulas – e as crianças que necessitavam da atenção das mães durante as aulas. “Nada disso atrapalhou o andamento das aulas. Fizemos um acordo entre todos nós que nada impediria que eles viessem a se formar”, comemora o professor, destacando que houve apenas uma desistência no decorrer do curso, uma taxa de evasão considerada muito baixa.
“O que aprendi com eles foi muito maior do que pude ensinar, justamente pelas dificuldades que eles enfrentaram para chegar até a sala de aula e reconhecer que necessitam ser qualificados para o mercado de trabalho no Brasil. Aqui, além de pessoas empregadas, vão sair empreendedores, porque há excelentes ideias se desenvolvendo”, afirmou o professor.
O casal Francis Paola e Wilmer Eduardo, que chegou ao Brasil em janeiro deste ano, precisou levar a filha, Melanie, de 4 anos, para todas as aulas. Na hora de buscar o certificado, a menina dormia tão serenamente no colo da mãe que nem mesmo as palmas para os pais a acordaram. “Foi difícil, mas quando uma pessoa quer, ela pode”, resume Francis.
Com a melhora do idioma, fruto dos estudos do casal, e os conhecimentos adquiridos ao longo curso, os dois conseguiram ser bem-sucedidos em entrevistas de emprego recentes. Há duas semanas, Paola começou a atuar como atendente em uma padaria, e o marido em breve começará a trabalhar em um supermercado.
Os irmãos Bryanni Elena e Brayhan Wladimir chegaram ao Brasil em fevereiro deste ano, ansiosos para trabalhar, e agora também conseguem enxergar um novo futuro. Na última semana de curso, o professor Osmany avistou, em uma lancheria em São Sebastião, uma placa procurando ajudante, e incentivou Bryanni a ir atrás da vaga. Com seu currículo de gerente de loja na Venezuela, e com os ensinamentos do curso sobre vendas e técnicas de atendimento ao público, ela fez uma entrevista e foi contratada na hora.
Mais velhos em uma turma formada majoritariamente por pessoas jovens, o casal Nestor Hugo e Anabel Cristina sonha empreender no ramo da gastronomia venezuelana. Para isso, atenderam às aulas mesmo com a rotina puxada de Nestor, que se levanta da cama às 4h para trabalhar como jardineiro, e sai do trabalho às 18h. “Minha ideia é poder dar emprego para outras pessoas também, e o curso me ajudou a entender sobre créditos e burocracia para abrir um negócio no país”, explicou.
Nestor representou a turma em um discurso para os colegas e familiares presentes na formatura: “Foi um curso não apenas de teoria e conhecimento de vendas, mas também sobre ética. O professor Osmany nos ensinou muito sobre valores, sobre união e sobre apoio. Sobre as vendas, nos ensinou que é sobre fazer as pessoas felizes. Então, vamos sair daqui bons empreendedores, bons empresários e bons profissionais que farão o melhor para este país que nos acolheu da melhor maneira”, disse, sob aplausos dos colegas.