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Em busca de segurança e de uma vida melhor na “selva” de Calais

Comunicados à imprensa

Em busca de segurança e de uma vida melhor na “selva” de Calais

Em busca de segurança e de uma vida melhor na “selva” de CalaisACNUR afirmou na última semana que existem aproximadamente 3 mil refugiados e migrantes em Calais e demais localidades na costa norte da França.
10 Agosto 2015

CALAIS, França, 10 de agosto de 2015 (ACNUR) – A Agência da ONU para Refugiados afirmou na última semana que existem aproximadamente 3 mil refugiados e migrantes em Calais e demais localidades na costa norte da França.

Virtualmente, o número segue sendo o mesmo de novembro de 2014. No entanto, o ACNUR demonstrou preocupação com o aumento de mortes entre as pessoas cruzando o Canal da Mancha a partir da costa francesa em direção ao Reino Unido. Pelo menos 10 pessoas morreram na travessia desde o início de junho deste ano.

Para a agência, a situação em Calais é reflexo dos movimentos migratórios e de refugiados na Europa, mas não se compara aos enormes deslocamentos na África e Oriente Médio.

É quase meia noite, Farad*, Yacine* e uma dúzia de outros refugiados bebem chá ao redor de uma fogueira em um abrigo improvisado na “selva” – como é conhecido um local próximo à vegetação –, em Calais. Eles falam sobre seus voos do Sudão, o caminho perigoso para a Europa e Calais, assim como seus planos e esperanças para o futuro.

É a última noite de Yacine por lá e seus amigos se juntaram para celebrar sua partida. No dia seguinte, às 6 da manhã, ele parte de ônibus de Calais para Paris e depois Metz, onde será alocado em um dos quartos de um centro de acolhimento para solicitantes de refúgio.

Yacine chegou a Calais há seis meses, logo após ter fugido do Sudão e viajado para Europa através da Líbia. Ele passou seis meses na estrada, viajou de caminhão, barco e de trem antes de chegar a Calais, onde ele pediu refúgio. Há pouco tempo ele teve sua primeira entrevista no Escritório Francês de Proteção a Refugiados e Apátridas (OFPRA – sigla em francês) e ocupará um quarto em centro de acolhida. Um de seus amigos, que já esteve em Paris, explicou como ele pode ir de Gare du Nord para Gare del’Est, onde terá que trocar de estação de trem para chegar a Metz na manhã seguinte. 

“Estou feliz e triste ao mesmo tempo. Hoje estou triste por deixar meus amigos na “selva”, mas amanhã ficarei feliz de chegar ao abrigo em Metz”, contou Yacine* com um sorriso no rosto.

Nem todos os amigos que celebram com ele a partida tiveram a mesma sorte. Todos dizem que fugiram da violência e do conflito, contam histórias de medo, mas não têm soluções para seus futuros. Eles dizem que a principal necessidade agora é proteção.  

Ibrahim*, de 30 anos, chegou em Calais em novembro de 2014 e vem de Darfur, no Sudão. Ele fugiu de seu país depois de ser preso e torturado, chegou à Europa passando pela Líbia e Itália. Ele teve suas digitais registradas na Itália, mas não quis ficar no país. Seu plano era ir para o Reino Unido, onde seria mais fácil viver por causa do idioma.

“Quando cheguei a Calais me disseram que se eu fosse para o Reino Unido, me mandariam de volta para Itália e a Itália me mandaria de volta ao Sudão. Alguém me orientou a solicitar refúgio aqui. Conheci Faustine e contei sobre minha situação. Ela me informou sobre os procedimentos para pedir refúgio na França, e me ajudou a marcar um horário com um advogado”, disse Ibrahim.

Faustine é uma assistente social que trabalha para a ONG francesa France Terre d’Asile, que tem um programa em Calais parcialmente financiado pelo ACNUR. Ela caminha pela assim chamada “selva” todos os dias informando sobre os procedimentos para solicitar o refúgio na França. Ela também acompanha os solicitantes, tira dúvidas e os ajuda a enfrentar dificuldades.

Desde o início de 2015, quase mil solicitações de refúgio foram feitas em Calais.

“Muitas das pessoas que estão na “selva” em Calais são refugiadas. Elas fugiram de conflitos, violência ou perseguição no Sudão, Eritreia, Somália e Síria, e necessitam de proteção internacional. Estas pessoas estão entre as 225 mil que chegaram pelo mar Mediterrâneo e entraram na Europa, em sua maioria pela Grécia ou Itália”, disse Philippe Leclerc, representante do ACNUR na França.

Pode levar meses entre solicitar refúgio e ser acomodado em instalações mais estruturadas.  Enquanto isso, pessoas como Ibrahim dormem em abrigos improvisados. Como ele entrou na Europa pela Itália, mas não quis solicitar refúgio naquele país, precisou esperar por seis meses para poder solicitar o refúgio na França.

“Fui à prefeitura em junho para solicitar o refúgio, e marcaram um horário comigo para sete dias depois. Me disseram que eu deveria esperar para fazer a entrevista com o OFPRA, e sigo aguardando. Talvez aconteça amanhã ou semana que vem. A vida aqui é difícil”, disse Ibrahim.  

Ibrahim está em Calais há um ano, primeiro ficou num “squat” – abrigo individual improvisado num galpão para albergamento coletivo - e agora vive na “selva”. Ele espera conseguir logo uma entrevista com OFPRA e um quarto em centro de acolhimento.

“Desde outubro de 2014 o governo francês vem aumentado o número de funcionários trabalhando com os solicitantes de refúgio e a OFPRA prioriza a análise destes pedidos. Somente em 2015 foram apresentadas mil solicitações de refúgio em Calais.

“O refúgio na França deveria tornar-se a principal alternativa para travessias irregulares do Canal da Mancha para aqueles que precisam de proteção internacional. Se as pessoas têm uma ligação próxima com outro país da União Europeia, a primeira entrevista deveria ser feita pela subprefeitura, permitindo a identificação deste país e que os oficiais franceses transfiram para este Estado a responsabilidade de análise do processo. O tempo de análise deveria ser reduzido, e os solicitantes deveriam ter acesso rápido a moradias decentes durante o processo”, acrescentou Philippe Leclerc.

Alguns não têm paciência para esperar por meses para solicitar refúgio na França e preferem tentar a sorte no Reino Unido.

Farad*, 26 anos de idade, também fugiu da violência no Sudão. Ele é um dos amigos de Yacine em Calais. Ele está feliz por Yacine ter conseguido um quarto no centro de acolhimento, mas acha que não conseguiria o mesmo, pois é grande a espera para solicitar refúgio e a probabilidade de ser reconhecido é pequena. Ele prefere ir ao Reino Unido, onde tem família e conhece um pouco o idioma.

“Cheguei a Calais em maio, desde então estou aqui. É difícil. Preciso de proteção e quero pedir refúgio no Reino Unido. Não quero pedir aqui na França, porque vejo como as coisas são por aqui. Leva muito tempo e muitas pessoas não são reconhecidas”, disse Farad.

“Sou formado em engenharia civil e pretendo continuar meus estudos. É muito difícil estudar e trabalhar na França. Não falo francês e não conheço ninguém. No Reino Unido, tenho família e falo inglês. Quero fazer mestrado e depois doutorado. Sou muito ambicioso, estou em busca de algo melhor”, concluiu Farad.  

Por Celine Schmitt em Calais/França

* Nomes trocados por razões de segurança.