Fabio Alperowitch fala sobre inclusão da causa dos refugiados na agenda ESG
Fabio Alperowitch fala sobre inclusão da causa dos refugiados na agenda ESG
Cerca de duas dezenas de CEOs de empresas brasileiras de portes variados foram indagados sobre qual sensação tinham quando ouviam a palavra “refugiados”. As respostas mais frequentes foram “compaixão” e “tristeza”, mas também foram comumente citadas as palavras “acolhimento”, “fragilidade”, “sofrimento” e “crueldade”.
Apenas um dos consultados mostrou distanciamento do tema, alegando ignorá-lo. Todos os demais, a partir de suas próprias palavras, não só demonstraram empatia à temática como também certa angústia com a situação dos refugiados.
A segunda pergunta ao grupo era para quais recortes as suas respectivas empresas agiam na agenda da diversidade e inclusão, ainda que fosse de forma periférica. A questão de gênero recebeu cerca de 90% dos votos, seguidos por raça, orientação sexual e pessoas com deficiência. Depois começaram a rarear as respostas para indígenas, idosos e refugiados que recebem o olhar de um número diminuto dos entrevistados no âmbito corporativo.
Apesar de a sondagem – realizada em 2022 – ter sido realizada com metodologia científica e contar com um número reduzido de respondentes, o resultado auferido nos suscita uma reflexão: por que a causa dos refugiados nos toca enquanto cidadãos, mas pouco nos leva a agir enquanto empresários?
O mundo corporativo observou o fortalecimento da pauta ESG nos últimos anos, o que deveria ter como consequência o desenvolvimento da pauta da diversidade e inclusão. Muitas empresas, cobradas por seus stakeholders para avançarem nesta agenda, acabam escolhendo temáticas mais populares (como a de gênero), deixando outros recortes de lado.
Ao endereçarem estas questões, as empresas já passam a ser percebidas como inclusivas, arrefecendo a pressão e disposição para olhar para outros recortes, que tendem a ficar mais ofuscados. Paradoxalmente, portanto, o ESG ilumina minorias, mas pode ofuscar os invisíveis, incluindo os refugiados. O mundo corporativo deve atentar-se a este risco em potencial.
A questão do refúgio tem ficado mais evidente a partir da Guerra na Ucrânia, eventualmente pela questão estar centrada no coração da Europa e pelos refugiados serem brancos, à semelhança da predominância das lideranças no mundo ocidental. Contudo, é importante observar que a questão dos refúgio é perene e o número de refugiados bate recorde a cada ano, inclusive no Brasil por conta do deslocamento forçado de pessoas da Venezuela.
Paralelamente, tem ficado cada mais explícita a questão climática e seus respectivos desdobramentos. Segundo o Banco Mundial, na atual toada, a mudança do clima causaria o deslocamento de 143 milhões de pessoas até 2050, um número quase vinte e cinco vezes maior do que a guerra na Ucrânia produziu até então.
Cabe frisar que o impacto social da questão dos refugiados desdobra-se em múltiplas frentes: instabilidade econômica, desequilíbrio do emprego, desigualdade social, xenofobia, violência, pobreza entre outros severos efeitos.
Se observamos cada vez mais o mundo corporativo abarcando a “Agenda 2030” e seus respectivos objetivos (ODS), a questão do refúgio deveria subir na escala das prioridades de ação e deixar de ser periférica: ações humanitárias e auxílio aos refugiados endereçam diretamente alguns dos mais importantes Objetivos do Desenvolvimento Sustentável como a Erradicação da Pobreza (ODS-1), Igualdade de Gênero (ODS-5) e Redução das Desigualdades (ODS-10).
Empresas que empregam refugiados têm relatado que eles se destacam pela alta motivação e engajamento, uma vez que para essas pessoas trata-se da oportunidade de reinício da vida, propiciando a integração no país e um futuro digno. Como consequência, o país tem benefícios claros com a redução da vulnerabilidade social e desigualdades, e aumento da arrecadação e consumo, na medida que os refugiados se tornam contribuintes e consumidores.
Um novo olhar para a questão dos refugiados faz-se fundamental e urgente. Empresas podem se engajar com a causa em múltiplas frentes, seja na oferta de emprego, contribuições financeiras e conscientização de seu público interno e stakeholders em relação à dimensão do problema.
O trabalho da ACNUR nesta frente há mais de 70 anos, tem oferecido rápidas respostas às mais diversas crises através da presença em 135 países. A atividade da agência é de complexidade extrema, envolvendo o salvamento de vidas, asseguração de direitos e construção de um novo futuro reintegrando pessoas à sociedade. Não à toa, a maravilhosa atuação nesta temática foi reconhecido duas vezes com o Prêmio Nobel da Paz (1954 e 1981).
Os sentimentos de “compaixão” e “tristeza” compartilhados por diversos líderes empresariais brasileiros merecem foco e atuação adequadas para que se tornem “orgulho” e “satisfação” em um futuro não distante.
O ACNUR realiza amplas parcerias corporativas, nas formas de apoio financeiro, ações com colaboradores e consumidores, divulgação de campanhas de doação em situações de emergência, marketing relacionado à causa, entre outras. Diante da complexidade das crises humanitárias atuais, o apoio financeiro de empresas é fundamental para ampliar o alcance e o impacto dos programas do ACNUR.