Horta comunitária une jovens brasileiros e venezuelanos em iniciativa sustentável
Horta comunitária une jovens brasileiros e venezuelanos em iniciativa sustentável
Já eram quase quatro horas da tarde e o sol começava a trazer um tom mais alaranjado ao dia. Mas em Roraima, o calor de fim de tarde é o mesmo que o do meio-dia. Ainda assim, a alta temperatura não foi capaz de desanimar o grupo de mais de 45 jovens venezuelanos do abrigo para refugiados e migrantes Jardim Floresta, em Boa Vista. Junto com outros 18 jovens brasileiros do Projeto Crescer eles colocaram a mão na terra para pôr em prática tudo o que aprenderam durante a Semana de Integração Socioambiental: Manos que Siembram.
A implementação da horta comunitária foi a última e mais esperada atividade dos três dias de oficinas organizados pelo ACNUR, a Agência da ONU para Refugiados, junto com a organização parceira Norwegian Refugee Council (NRC) que administra o abrigo Jardim Floresta, um dos 13 abrigos para refugiados e migrantes em Roraima que recebem o apoio financeiro da União Europeia por meio do departamento de Ajuda Humanitária e Proteção Civil (ECHO).
As oficinas, que ocorreram entre 9 e 11 de outubro, receberam o apoio da Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (CAER) e do Projeto Crescer da prefeitura de Boa Vista, voltado para capacitação de jovens de 15 a 22 anos que vivem em regiões de alta vulnerabilidade social da cidade.
Michele Garsillo, de 17 anos, que costumava trabalhar com plantio junto a sua avó na Venezuela, ficou muito feliz de ter a oportunidade de lidar com a terra novamente. “O que mais gostei foram as informações sobre como plantar e como cuidar da terra. Já fazia isso com minha avó, mas não tinha todo o conhecimento que recebemos nessa semana”, lembra Michelle.
A oficial de participação comunitária da organização não-governamental NRC, Júlia Machado Dias, explica que um dos grandes motivos para a criação da horta e das demais ações foi proporcionar uma atividade construtiva aos jovens que ainda não estão matriculados nas escolas estaduais. O projeto possibilita que os jovens tenham acesso a novas técnicas que podem favorecer e expandir suas chances de inserção socioeconômica em um futuro próximo.
“Como vários desses jovens ainda não estão estudando, acabam tendo muito tempo livre. Criamos então os grupos de limpeza do abrigo onde eles participam ativamente, e sugerem novas atividades. Isso faz eles se sentirem úteis. Assim, eles trazem benefícios para eles, para a comunidade e contribuem para a integração local”, diz Júlia.
Saneamento, higiene pessoal, e a conscientização sobre desperdício de água e comida, especialmente considerando a situação de racionamento de recursos que o estado enfrenta, foram alguns dos temas ministrados durante a semana. Além das sessões teóricas, os alunos também participaram de atividades práticas como limpeza da área do abrigo, seleção e coleta de lixo e a construção da horta.
O jovem Wvilian Rodriguez, de 14 anos, participou de todas as atividades da semana. Sempre perto dos instrutores, era um dos primeiros a se oferecer para alguma tarefa. “Eles me ensinaram a plantar, a lidar com a terra e agora eu quero cultivar mais flores e mudas de amoras e tomates”. O jovem reforçou ainda a importância de manter o abrigo sempre limpo para uma melhor qualidade de vida de todos os habitantes do local.
Para o coordenador das oficinas e assessor socioambiental da Secretaria de Gestão Social da prefeitura de Boa Vista, Luís Felipe Gonçalves, essa integração entre brasileiros e venezuelanos em projetos que agreguem a comunidade é fundamental para a aproximação entre as duas nacionalidades.
“Trazer meus alunos para cá foi importante para que eles conhecessem a realidade dentro de um abrigo, como é a vida desse jovens venezuelanos e entendessem tudo que eles passaram. Também foi importante para os jovens do abrigo começarem a se integrar com a comunidade local. E tudo isso por meio de atividades sustentáveis como essas”, afirma Luís.
A horta, que foi construída com material reciclado do próprio abrigo e com doação de mudas de amora, tomate e algumas plantas medicinais e ornamentais é uma das iniciativas que vem sendo implementadas nos espaços de atuação do ACNUR na resposta a situação da Venezuela no estado de Roraima, explica o conselheiro ambiental de campo do ACNUR, Fabiano Sartori.
“As atividades realizadas nesta semana só foram possíveis por meio da colaboração do município e das organizações parceiras. Quanto mais conseguirmos unir instituições governamentais e não-governamentais para propósitos socioambientais, mais projetos poderão ser implementados tanto em outros abrigos como fora deles. Esse é um contexto em que todos podem ser beneficiados, pessoas refugiadas, comunidade local e meio ambiente”, explica Fabiano.