Lutar contra a exclusão do silêncio: refugiados vivendo com HIV em Sucumbíos
Lutar contra a exclusão do silêncio: refugiados vivendo com HIV em Sucumbíos
LAGO AGRIO, Equador, 1 de dezembro (ACNUR) - Quando fugiu de casa aos 15 anos, a colombiana Lucilda* estava motivada pela raiva de sua mãe por ela ter ido a uma festa sem sua permissão. Esta noite de fuga a trouxe dez anos depois a Sucumbíos, Equador, onde é refugiada e onde descobriu que era uma pessoa com HIV, quando seu esposo falecia de uma doença oportunista relacionada à AIDS.
“Ele morreu há dois meses. Estava muito doente, mas não queria ir ao hospital. Eu o levei e lá me disseram o que ele tinha e que eu também estava infectada. Ele sabia, sabia que tinha AIDS. Mas nunca me disse”, conta esta jovem, de menos de 30 anos e mãe de três filhos. “Pelo menos eles estão saudáveis.”
Ela vive com seus filos em um quarto humilde, que paga com os cinco dólares que ganha lavando roupa à mão. Não conhece ninguém, somente a família de seu esposo morto. “Eles têm medo de mim, de que eu os contagie, têm medo até de me tocar. Dizem que com o vapor de meu corpo também vou contagiá-los.”
A longa história desta mulher começou com uma aventura juvenil. Sem sequer portar documentos, a fuga a levou a trabalhos mal pagos, ao medo de viver no departamento colombiano de Putumayo, o qual sofre com os impactos dos conflitos internos. Lá encontrou um esposo por quem se apaixonou perdidamente. Nunca voltou para sua casa. Casou, teve filhos. Um dia descobriu que o esposo a traía.
“Descobri que ele estava com outra mulher. E não queria mais que me tocasse. Mas ele pegou uma faca e me obrigou. Porque era meu esposo, mas eu não queria estar com ele e ele me obrigou. Senti que outra pessoa me violava.”
A história de traições, e suas conseqüências, corre paralelamente a uma vida marcada pelas pressões que a família vivia por causa do conflito. Pressões que os obrigaram a deixar sua casa na Colômbia para fugir ao Equador. “Aqui a vida também é difícil, a gente não conhece nada, tudo é diferente. Quando me disseram no hospital que também tinha HIV eu quis correr e me jogar na frente de um automóvel”, conta.
Lucilda, como muitas outras pessoas, contraiu a enfermidade porque seu parceiro não quis reconhecer uma conduta sexual de risco. Infecções por HIV tiveram a taxa de incidência duplicada no último ano em Sucumbíos. Enquanto mulher refugiada, sozinha e com filhos, ela econtra-se na difícil situação de ter que ficar calada, de silenciar sobre sua doença, ao mesmo tempo em que luta para integrar-se em uma sociedade que não compreende os desafios daqueles que devem se integrar em outro país.
“Ninguém sabe que estou infectada. Sigo com o tratamento que felizmente me dão aqui.Tenho medo que caso os outros saibam eu não consiga mais trabalhar. O dono do quarto que alugo diz que se eu dormir com ele não preciso pagar o aluguel”, conta.
Como Lucilda, cada oito em dez mulheres residindo em Sucumbíos vêem a violência como um sintoma que se manifesta na forma de exploração, violência sexual ou de gênero, violência psicológica, intra-familiar, e que devem enfrentar sozinhas.
Essa solidão, explica Xavier Creach, chefe do Escritório do ACNUR em Lago Agrio, se converte em exclusão. “O estigma que acompanha infecções e doenças de transmissão sexual, como HIV e AIDS, aumenta os riscos envolvidos no silêncio social”.
* O nome foi alterado por razões de proteção.
Sonia Aguilar em Sucumbíos