Perda de esperança e pobreza extrema levam os sírios a pedir refúgio na Europa
Perda de esperança e pobreza extrema levam os sírios a pedir refúgio na Europa
GENEBRA, 29 de setembro de 2015 (ACNUR) - A Agência da ONU para Refugiados afirmou que a perda de esperança e as péssimas condições de vida na Síria são os principais fatores por trás do recente aumento no número de sírios em busca de refúgio na Europa.
Cerca de quatro milhões de refugiados sírios vivem atualmente em países vizinhos, mas nos últimos meses houve um aumento acentuado no número de pessoas que procuram refúgio ainda mais longe, principalmente na Europa.
Amin Awad, diretor do ACNUR para o Oriente Médio e Norte da África, disse em Genebra que essa situação se dá principalmente por causa de uma perda de esperança em poder voltar para casa e da deterioração das condições de vida nos países onde os refugiados sírios vivem atualmente.
"Os refugiados enfrentam condições horríveis de vida, e restrições nos regimes legais de refugiados nos países onde vivem. Quando as pessoas não têm abrigo adequado e estão vivendo com 45 centavos por dia, é óbvio que elas vão querer se mover", disse Awad para jornalistas. "Os sírios estão saindo dos países vizinhos", completou o diretor do ACNUR.
No total, já foram quase 429 mil pedidos de refúgio apresentados por sírios na Europa desde 2011. Devido à falta de estruturas de acolhimento na Europa, muitos dos que chegaram recentemente ainda devem solicitar refúgio.
"Os refugiados estão adotando estratégias negativas de sobrevivência, como trabalho infantil, evasão escolar, mendicância e prostituição. Eles precisam de muito mais apoio", disse Awad, que também é o coordenador da resposta regional para os refugiados da Síria.
"São pessoas originárias de uma sociedade que dá muito valor à edução e que agora estão vendo suas crianças fora da escola”, completou o diretor. Ele ressaltou que o problema só será solucionado quando for encontrada uma solução que estabilize a Síria e a região.
"A Síria está queimando: cidades estão destruídas e é por isso que as pessoas estão deixando o país. É por isso que temos uma avalanche, um tsunami de pessoas em direcção à Europa. Enquanto não houver uma solução para o conflito na Síria e não houver melhora nos países vizinhos, as pessoas vão continuar migrando para a Europa", disse Amin Awad na sede ONU, em Genebra.
Com base num trabalho contínuo de acompanhamento e avaliação, e também a partir dos resultados de discussões em grupo e do contato diário com refugiados na Jordânia, Líbano, Egito e Iraque, o ACNUR identificou sete principais fatores que os motivam a buscar refúgio fora da região. São eles:
- Perda da Esperança
Com a crise da Síria agora em seu quinto ano e nenhum sinal de uma solução à vista, a esperança é cada vez menor para muitos refugiados. Sentimentos de incerteza sobre o futuro são agravados por condições miseráveis, alimentando um sentimento de aflição e desespero.
- Alto custos de vida e pobreza extrema
Os refugiados no Líbano citam o alto custo de vida como uma variável importante para decidir ficar no país ou buscar refúgio em outro lugar. No Egito, os refugiados dizem que está ficando mais difícil pagar o aluguel, gerenciar altos níveis de endividamento e pagar suas necessidades básicas. Na Jordânia, a incapacidade de sustentar uma família é a razão mais comum citada por quem conhece alguém que foi embora.
O efeito cumulativo de quatro anos no exílio com acesso restrito ao emprego legal foi também citado como um fator para o novo deslocamento. Em muitos casos, as economias pessoais estão esgotadas, objetos de valor foram vendidos e muitos refugiados na região vivem em condições miseráveis, lutando para pagar o aluguel, alimentar suas famílias, e cobrir necessidades básicas.
- Oportunidades limitadas para subsistência
Sem poder trabalhar, muitos refugiados lutam para ganhar a vida. A falta de oportunidades de subsistência ou o acesso ao mercado formal de trabalho foram citados como problemas pelos refugiados no Líbano, Egito e Jordânia. Refugiados sírios no Iraque dizem que o grande número de pessoas deslocadas internamente aumentou a concorrência por empregos na região do Curdistão. Enquanto isso, o trabalho em canteiros de obras na região está escasso com a queda no preço do petróleo.
Desesperados para se sustentar e sem acesso ao trabalho foram, os refugiados submetem-se à exploração, trabalhando em condições inseguras ou tendo seu salário retido por empregadores inescrupulosos. Quando são pegos trabalhando ilegalmente, alguns refugiados enfrentam sanções. Na Jordânia, por exemplo, eles são devolvidos aos campos. No Líbano, os refugiados são obrigados a assinar um temor de compromisso de não trabalhar enquanto renovam seus documentos de residência.
- Ajuda insuficiente
Programas de ajuda a refugiados e comunidades de acolhida na região têm sido afetados pela escassez de financiamento. O atual plano inter-agencial de resposta à crise de refugiados sírios para 2015 (conhecido como 3RP) tem apenas 41% do seu custo total financiado, o que significa cortes na ajuda alimentar para milhares de refugiados ou o equivalente a menos de US$ 0,50 por dia. Para muitos refugiados na Jordânia, os cortes de ajuda alimentar do Programa Mundial de Alimentos (PMA) foram a gota d'água em sua decisão de deixar o país. Milhares de pessoas perderam a ajuda em dinheiro, afundando cada vez mais em dívidas. Como resultado, recorrem a estratégias negativas de sobrevivência - incluindo mendicância, trabalho infantil e aumento do endividamento. A diminuicão ajuda humanitária foi citada por refugiados no Iraque, Jordânia, Líbano e Egito como causa de desespero e um fator para continuar migrando.
Na Jordânia, devido ao financiamento inadequado, refugiados perderam o acesso gratuito aos serviços de saúde. Como resultado, 58,3% dos adultos com doenças crónicas estão sem atendimento – mais que os 23% que se encontravam nesta situação em 2014. Há também uma acentuada diminuição no acesso aos cuidados de saúde curativa e preventiva
- Obstáculos para renovar a residência legal
No Líbano, novos regulamentos para refugiados sírios tornaram mais difícil conseguir refúgio e transitar em direção à Turquia. Refugiados que já estão no país têm que pagar US$ 200 por ano para renovar sua permanência e são obrigados a assinar um compromisso que os obriga a não trabalhar enquanto os novos documentos não são expedidos. Muitos refugiados estão com medo de serem presos ou detidos e sentem-se vulneráveis por causa de vistos de residência que caducam rapidamente.
Na Jordânia, as autoridades estão adotando fiscalizações mais duras para garantir que todos os sírios que residem fora dos campos de refugiados tenham um novo documento de identidade para acessar serviços. O custo de um plano de saúde como parte do processo para conseguir tal document pode ser proibitivo.
- Escassas oportunidades de educação
Oportunidades de educação limitadas foram citadas como um problema para os refugiados na Jordânia, Egito, Líbano e Iraque. A educação é altamente valorizada entre os sírios, que tinham educacão gratuita e obrigatória antes da guerra. O agravamento das condições que os refugiados enfrentam no exílio deixam um impacto devastador sobre sua educação. Na Jordânia, cerca de 20% das crianças estão abandonando a escola para trabalhar e, em alguns casos, as meninas estão sendo forçadas a casar prematuramente. Cerca de 90 mil sírios em idade escolar não têm educação formal: 30 mil destes tem acesso apenas à educação informal e os demais não têm acesso a qualquer forma de educacão.
No Líbano, onde a educação é gratuita para sírios no sistema integral, muitas crianças se esforçam para ir a escola e ao mesmo tempo trabalhar para sustentar suas famílias. Embora o Ministério da Educação tenha aumentado em 100% o número de vagas para crianças sírias (200 mil no ano letivo de 2015/2016), outras 200 mil crianças sírias ficarão fora da escola este ano.
Em toda a região, jovens sírios estão deixando seu ensino superior e perdendo a esperança em seu futuro.
- Sentimento de inseguranca
A maioria dos deslocados sírios que estava viajando fora do Iraque relatou ao ACNUR um sentimento de insegurança em relação ao país. Muitas pessoas de grupos minoritários vêem a migração como a chave para a sua segurança física.
Por Ariane Rummery, Geneva