Refugiados iniciam curso no Sebrae para abrir empresas no Brasil
Refugiados iniciam curso no Sebrae para abrir empresas no Brasil
SÃO PAULO, 28 de abril de 2016 (ACNUR) - Cristiano Estreeter Botero, colombiano de 39 anos, era o proprietário de uma empresa exportadora de madeira quando foi forçado a deixar seu país com a família para o Brasil, em 2013, devido a ação de grupos armados na Colômbia. Em São Paulo, ele dá aulas de inglês e faz curso de marcenaria e tapeçaria no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), onde sua mulher segue as aulas de desenho de interiores. Na noite de terça-feira, 26 de abril, em São Paulo, Estreeter assistiu à aula inaugural do Refugiado Empreendedor, projeto organizado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) em parceria com o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare). Outros 239 refugiados se inscreveram no curso.
“Minha empresa e seu maquinário ficaram lá no passado, na Colômbia. Nós agora estamos aprendendo do nada, costurando estofados e criando móveis de madeira, para abrir uma nova empresa no Brasil”, afirmou Estreeter, pai de três crianças, que mantêm graças ao ensino particular de inglês.
O projeto Refugiado Empreendedor tem o apoio da Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) e o objetivo de capacitar os refugiados para a abertura e a administração de suas próprias empresas no Brasil. Para parte dos refugiados, especialmente em São Paulo, a busca por um emprego não é o caminho definitivo para a inserção econômica. Trata-se de uma opção temporária, válida até o momento de dar vazão à sua vocação empresarial.
O casal refugiado sírio Hoda Al-Daia e Maher Hamouda, por exemplo, se desdobra há dois anos e dois meses entre várias atividades para educar os três filhos e cumprir com as despesas de casa em São Paulo. Os dois mantêm uma barraca de pratos árabes em uma feira de refugiados no bairro do Brás, montada nos fins de semana. Mas ela ainda atende como cabelereira em casa, em um salão impressionado, enquanto Hamouda trabalha durante a semana como pintor paredes. Os dois se inscreveram no curso de empreendedorismo.
“Como já trabalhamos com comida, acho que será inevitável abrirmos um pequeno restaurante. Queremos seguir este curso para saber exatamente como abrir e como manter um negócio. Há muitas regras e normas que não conhecemos”, afirmou Hoda Al-Daia, de 32 anos.
A segunda etapa será presencial e mais seletiva: poderão cursar apenas os refugiados com mais de um ano no país, com conhecimento de português básico, que concluíram o primeiro ciclo no prazo e que já possuam o Cadastro de Pessoa Física (CPF), da Receita Federal do Brasil. Nessa fase, que começa em 24 de maio, serão abordados temas mais específicos. O Sebrae colocará à disposição uma terceira etapa, no segundo semestre deste ano, com palestras e oficinas sobre a formalização do negócio e o acesso ao microcrédito.
“Empreender é uma tarefa desafiadora. Quando procurou o Sebrae para montar este projeto, o Conare mostrou-se interessado em adotar políticas públicas para capacitar o refugiado a empreender”, afirmou Nelson Hervey, gerente de Políticas Públicas e Relações Institucionais do Sebrae-SP. “Vocês podem buscar a alternativa do emprego, mas estão aqui porque querem a do autonegócio”, completou, para em seguida explicar os limites e requisitos para o registro do Microempreendedor Individual (MEI), o modelo da mais modesta empresa formal no país, para a pessoa que trabalha por conta própria.
Para Vinícius Feitosa, assistente de Proteção da unidade do Acnur em São Paulo, o empreendedorismo pode ser visto, no caso dos refugiados, como uma chance para uma pessoa que foge da perseguição e/ou do conflito em seu país de origem de recomeçar sua vida. “Ao empreeder, o refugiado contribui tanto para sua autosuficiência quanto para a sociedade em que está inserido. É uma forma de valorizar o capital humano”, disse Feitosa, ao ressaltar a resiliência como ponto central na trajetória de vida dessas pessoas.
Segundo Juliana Gregory Mee, da Assessoria Internacional do Sebrae Nacional, os refugiados empreendedores não são obrigados a formalizar seu negócio. Mas o papel do Sebrae, ressaltou ela, é oferecer a formação adequada para a escolha de cada refugiado.
“Eu quero abrir uma empresa de montagem de andaimes para construções”, afirmou Maduabuchi Prince Uda, refugiado nigeriano de 25 anos, que comentou ter sido essa sua atividade na Nigéria. Prince Uda, que vive em São Paulo há dois anos, trabalha atualmente no setor de limpeza de um hospital e faz cursos de português, idioma que ainda não domina.
Parte dos inscritos para o curso ainda não tem ideia precisa sobre seu futuro negócio e busca nas aulas a orientação sobre os setores e mercados mais interessantes e adequados a suas condições, além das noções de administração. Nathalie Kankolongo, de 35 anos, proveniente da República Democrática do Congo (RDC), pensa em abrir uma loja, mas não sabe quais produtos vender. Rolly Iyvaleke, de 30 anos, estudava Medicina na RDC e agora, como refugiado, trabalha em serviços de limpeza. “Queria abrir um negócio relacionado à área de Saúde”, disse.
José Pele Messa, angolano de 45 anos, era jornalista e apresentador de programa de notícias em um canal de televisão e se refugiou no Brasil por razões políticas. Orgulhoso de seu segundo nome, uma homenagem ao craque do futebol Pelé, Messa ainda não sabe qual em qual negócio apostar, mas já se preocupa com seu acesso às fontes de financiamento de seu futuro projeto. Atualmente, ele trabalha em um supermercado em São Paulo.
Por Denise Chrispim, de São Paulo.