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Com assistência do ACNUR e emprego garantido, 130 venezuelanos são interiorizados para Mato Grosso do Sul

Comunicados à imprensa

Com assistência do ACNUR e emprego garantido, 130 venezuelanos são interiorizados para Mato Grosso do Sul

29 Março 2019
Representante do ACNUR orienta venezuelanos antes do voo de interiorização © ACNUR / Alan Azevedo

Após duas horas de voo, o avião que decolou de Boa Vista (Roraima) no último sábado (24/03) levando refugiados e migrantes venezuelanos para Campo Grande (Mato Grosso do Sul) enfrentou uma forte turbulência. Enquanto alguns passageiros se retraíam em suas poltronas e outros olhavam preocupados pela janela, o venezuelano Daniel Andrade, de 29 anos, sorria e brincava. “Isso não é nada perto do que eu passei no Brasil quando cheguei da Venezuela”.

Dormindo nas ruas de Boa Vista por quase um mês, Daniel buscou apoio no centro de registro e documentação da Operação Acolhida na cidade e conseguiu, por meio da estratégia de interiorização, um emprego na cidade de Dourados (interior do Mato Grosso do Sul). Em busca de melhores oportunidades de integração, ele confirmou sua participação na estratégia, refez as malas e embarcou rumo a uma nova vida.

Daniel é um dos cem venezuelanos embarcados há uma semana para Dourados. Outros trinta, divididos em diferentes voos comerciais, também se juntaram ao grupo, que começa a trabalhar na cidade no próximo dia 8 de abril. No total, são 15 casais e cem homens solteiros. Assim como Daniel, todos receberam um auxílio financeiro emergencial do ACNUR, com o qual poderão custear o primeiro mês de aluguel e outras despesas emergenciais até receberem seu primeiro salário. O voo foi fretado pela Organização Internacional de Migração (OIM).

Daniel embarca no ônibus para o aeroporto de Boa Vista com outros venezuelanos © ACNUR / Alan Azevedo

Com emprego garantido em Dourados e beneficiado com um auxílio financeiro da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), a última coisa que incomodava Daniel era a turbulência do avião.

“Em Boa Vista morei na região da rodoviária, dormindo sobre papelão e passando frio. Durante o dia, tínhamos que caminhar por toda a cidade até a hora de dormir”, conta ele. Daniel não chegou a ser acolhido em um dos abrigos existentes em Boa Vista, pois ele foi selecionado rapidamente para uma das vagas de trabalho disponíveis em Dourados por meio da interiorização.

Esta estratégia é uma das frentes de atuação da Operação Acolhida – iniciativa do governo federal para operacionalizar a assistência e acolhimento de refugiados e migrantes venezuelanos em situação de maior vulnerabilidade e que conta com apoio de agências da ONU, organizações da sociedade civil e setor privado.

Fila de venezuelanos para realizar o check-in no aeroporto de Boa Vista © ACNUR / Alan Azevedo

Frente à perspectiva de um novo emprego, Daniel desabafa: “Estou emocionado porque já quero começar a trabalhar, mostrar o que sei fazer. Estou preparado para qualquer desafio que vier”.

Conduzida pelas Forças Armadas, essa modalidade da estratégia de interiorização, com oferta de emprego, é apoiada pelo ACNUR por meio de um auxílio financeiro emergencial, que ajuda os refugiados a se estabelecerem na cidade e suprirem suas necessidades básicas durante o primeiro mês na nova cidade de acolhida. O Instituto Migrações e Direitos Humanos também apoia a iniciativa e foi responsável por viabilizar os pagamentos.

“Para muitos, especialmente para a população com alto grau de vulnerabilidade, é difícil se integrar sem um apoio adicional. Com recursos dos nossos doadores, o ACNUR oferece auxílio financeiro para facilitar o pagamento de aluguel e ajudar nas despesas do dia a dia, como alimentação e transporte. Com isso, as pessoas têm estrutura para buscar um trabalho que permita a elas terem autonomia e recomeçar a vida em plenitude”, afirma o representante da Agência da ONU para Refugiados no Brasil, Jose Egas.

Para receber e acolher os venezuelanos em Dourados, entidades da sociedade civil identificaram casas disponíveis para o aluguel e conseguiram doações de alimentos, itens de mobiliário, produtos de higiene, roupas e outros artigos essenciais.

Representantes de diferentes religiões em Dourados se uniram para proporcionar um carinhoso acolhimento. “Sou muito grato de fazer parte desse projeto com parceiros de outras denominações religiosas, como as igrejas Católica, Metodista e Protestante. Todos esses líderes estão juntos em um único propósito: servir nossos irmãos venezuelanos para que possam recomeçar uma vida digna e honesta”, explica o bispo Maykon Ferreira, da igreja cristã.

Refugiados e migrantes desembarcam no aeroporto de Campo Grande © ACNUR / Alan Azevedo

Instalado em Dourados, na sala de sua nova casa, que dividirá com um casal de venezuelanos que já reside na cidade, Daniel Andrade diz que o programa de interiorização é uma nova oportunidade de fazer algo muito melhor. “Sem isso, nada seria possível. Se não houvesse esse programa, uma pessoa como eu não teria a oportunidade de conseguir coisas melhores para poder ajudar a família”.

Com essa nova rodada de interiorização, o número total de refugiados e migrantes realocados sobe para mais de 5,2 mil. A estratégia já envolve 50 cidades brasileiras em 17 Estados diferentes.

Para o representante do ACNUR no Brasil, o país é um exemplo em resposta humanitária. “O Brasil está protegendo os refugiados e migrantes venezuelanos. Sua situação é difícil, e seu grau de vulnerabilidade, muito alto. A resposta humanitária no Brasil é uma resposta coordenada que envolve autoridades governamentais em diferentes níveis, o sistema ONU, a sociedade civil e o setor privado. Ela deve continuar”, afirma José Egas.

Médicos, engenheiros e veterinários - “Estava estudando o sexto semestre de medicina na Venezuela. Mas tive que dormir na rua quando cheguei, na época de chuva. Vinha com a meta de trabalhar, e já havia perdido a esperança de seguir estudando”, conta o jovem Alexander Diaz, de 21 anos, outro novo morador de Dourados.

Formado como farmacêutico e com habilidades de socorrista, Alexander foi encaminhado pela Operação Acolhida ao abrigo Rondon 1, em Boa Vista, onde permaneceu por sete meses. Ele conta que realizou dois partos no abrigo, onde também foi voluntário como educador social dando aulas de biologia para jovens de onze a dezessete anos. Por esta atividade, conseguiu um certificado de educador social.

Alexander Diaz se prepara para embarcar na aeronave © ACNUR / Alan Azevedo

Alexander viu na estratégia de interiorização uma chance de continuar crescendo profissionalmente. Com o novo emprego e uma nova cidade, o jovem espera poder recomeçar a sua vida e seguir seus objetivos. “Meu sonho, e espero nunca perder esta motivação, é ser médico. Custe o que custar, quero conseguir”.

A empresa alimentícia de Dourados, que agora soma mais de duzentos venezuelanos entre seus funcionários, avalia como muito positivo o desempenho deles no trabalho. Existe inclusive o interesse em colocar aqueles com ensino superior em posições de liderança em áreas relacionadas às suas formações e experiências de trabalho, uma vez que parte desses venezuelanos são engenheiros e veterinários.

Jinmy Payagua, que chegou a Dourados em fevereiro de 2019, na primeira leva de interiorização com trabalho garantido, conta um pouco sobre sua experiência na empresa. “Gosto muito do meu trabalho. Nunca tive essa oportunidade em 39 anos de vida. É um trabalho onde nos respeitam como estrangeiro, são pessoas que nos valorizam muito. Eles são solidários com nosso sofrimento e nossas dores. Além de tudo estou aprendendo algo novo. Agradeço por essa oportunidade”.

Após uma longa viagem, venezuelanos chegam à Dourados para uma nova vida © ACNUR / Alan Azevedo

Auxílio que salva - A concessão de auxílios financeiros pelo ACNUR visa promover o acesso a serviços, a segurança e a dignidade dos refugiados e migrantes venezuelanos que voluntariamente aderiram à estratégia de interiorização. Em caráter emergencial e temporário, a bolsa auxilia na proteção e favorece a autossuficiência econômica e social de venezuelanos que querem ficar no Brasil. É o caminho para que essas pessoas possam reconstruir suas carreiras e objetivos profissionais.

O venezuelano Luiz Salazar, que vivia em um abrigo de Boa Vista, agora está morando em Dourados numa casa grande, com cinco quartos e quintal. “Podemos nos juntar em grupos para facilitar o pagamento do aluguel, que fica mais barato. Serei eternamente agradecido”, diz ele sentado na sala de sua nova casa, que dividirá com outros 14 colegas. “Isso vai me ajudar em meu sonho, que é simples: ter uma família digna”.

Após uma longa viagem, venezuelanos chegam à Dourados para uma nova vida © ACNUR / Alan Azevedo

Até o momento, o ACNUR já concedeu mais de 3,2 mil bolsas para 4,1 mil refugiados e migrantes venezuelanos com o apoio de fundos da União Europeia (Proteção Civil e Ajuda Humanitária). Em Dourados, já são mais de duzentos venezuelanos beneficiados, que compartilham a mesma esperança: trabalhar, contribuir com a sociedade, reunir-se com a família e ter um futuro próspero e digno. É para isso que trabalham todos os envolvidos na estratégia de interiorização da Operação Acolhida, que acaba de completar um ano de vida neste mês de março.