Refugiados, migrantes e apátridas elegem 60 propostas para guiar a construção de política nacional sobre o tema
Refugiados, migrantes e apátridas elegem 60 propostas para guiar a construção de política nacional sobre o tema
A 2ª Conferência Nacional sobre Migrações, Refúgio e Apatridia (COMIGRAR) foi concluída com a eleição de 60 propostas prioritárias para orientar a elaboração de políticas públicas de abrangência nacional em prol das populações refugiadas, migrantes e apátridas.
Sediado na Universidade de Brasília entre os dias 8 e 10 de novembro, o evento buscou proporcionar um espaço de participação social para refugiados, migrantes e apátridas que vivem no Brasil, além de representantes da sociedade civil, governos locais, academia, entidades do sistema ONU, entre outros. Estiveram presentes cerca de 260 delegadas e delegados eleitos durante a etapa preparatória da Conferência.
Responsável pela organização da 2ª COMIGRAR, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), por meio da Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), esteve atento às demandas e reivindicações dessa população. “Eu tenho certeza de que as discussões da COMIGRAR irão fundamentar a construção da Política Nacional para Migrações, Refúgio e Apatridia (PNMRA) e o desenvolvimento do Plano Nacional sobre essa temática. Esse é um governo da participação popular e nosso compromisso é de acolher as propostas feitas por vocês”, disse o Secretário Nacional de Justiça, Jean Uema. A PNMRA está prevista na Lei de Migração de 2017 e está em processo de elaboração desde o início de 2023.
Em seu discurso na abertura da COMIGRAR, o Representante do ACNUR Brasil, Davide Torzilli, destacou que a expectativa é de que a conferência resulte em novas estratégias de acesso aos direitos setoriais: à saúde, educação, trabalho, dentre outros. Isto passa por garantir novos mecanismos nos serviços públicos existentes, por criar serviços especializados, ampliar o investimento orçamentário em ações dedicadas, e melhorar a coordenação interfederativa e com os demais atores sociais.
“Enquanto ACNUR, esperamos que sejam fortalecidos os mecanismos de participação social como conselhos, comitês, fóruns e redes de organizações comunitárias, bem como a lógica de complementariedade entre a política migratória e o sistema de proteção internacional a pessoas refugiadas, com mecanismos jurídicos mais robustos de acesso a direitos, a partir de uma escuta sensível às especificidades das diferentes trajetórias de deslocamentos” ressalta.
O representante finaliza reforçando que espera também a inclusão de mecanismos de respostas mais previsíveis a serem ativados para movimentos futuros de pessoas, ou seja, a elaboração de novas estratégias de contingência, novos protocolos e estruturas de recepção em fronteiras, aeroportos, portos.
Aproximadamente 700 pessoas participaram da Conferência Nacional. Iniciada ainda em 2023, as etapas locais e regionais da COMIGRAR somaram 14 mil participantes em 119 conferências preparatórias – 22 foram promovidas por estados e pelo Distrito Federal e 97 promovidas por grupos da sociedade civil.
Os delegados eleitos da 2ª COMIGRAR, dos quais quase dois terços eram pessoas refugiadas e migrantes, debateram e votaram propostas em seis eixos temáticos: (i) igualdade de tratamento e acesso aos serviços públicos; (ii) inclusão socioeconômica e promoção do trabalho decente; (iii) interculturalidade e diversidade; (iv) governança e participação social; (v) regularização documental; e (vi) enfrentamento das violações de direitos.
Isso permitiu a realização de discussões em áreas como a revalidação de diplomas, o acesso ao trabalho digno e mecanismos de geração de renda, o fortalecimento de estruturas sociais de acolhimento, a ampliação da presença de mediadores culturais em serviços públicos e o fomento às aulas de português, entre outros. A íntegra da votação das propostas priorizadas pode ser assistida no canal do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
“Para nós, é importante estar aqui para levar à esfera nacional as lutas que estamos tendo nos municípios, nos estados. Juntamos todas as lideranças que foram eleitas como delegadas para trazer as demandas e articulações que estamos lutando na nossa militância para trazer essas vozes para a capital federal, para que possamos conseguir um Plano e uma Política Nacional”, comenta a delegada da COMIGRAR Hortense Mauyi, da República Democrática do Congo.
Para a Oficial de Proteção do ACNUR, Silvia Sander, a construção de todo o processo junto da população é um dos ativos mais relevantes da conferência.
"A 2ª COMIGRAR nos mostra, mais uma vez, que as melhores respostas no processo de elaboração das políticas públicas devem sempre partir da escuta e participação ativa das populações refugiadas, migrantes e apátridas. A conferência representa um espaço fundamental e estratégico para se construir uma inteligência coletiva e democrática mais capaz de inovar na promoção do acesso a direitos e soluções", comenta.
O trabalho desenvolvido pelo ACNUR junto a COMIGRAR foi registrado no blog: acnur.org/br/ii-comigrar. O histórico das conferências está disponível no site do Ministério da Justiça.
Uma abertura memorável
A Orquestra Sinfônica Jovem do Sesc-RR, composta por músicos refugiados e migrantes da Venezuela, abriu o evento, que contou também com a exibição de vídeo de boas-vindas do Ministro da Justiça de Segurança Pública, Ricardo Lewandowski. O ministro ressaltou o compromisso do governo com a participação social como pilar das políticas públicas.
“A 2ª COMIGRAR soma-se a outras importantes conferências nacionais realizadas desde 2023, como as de Assistência Social, Segurança Alimentar, Educação, Cultura e Direitos da Criança e do Adolescente. Estamos reafirmando que a construção de direitos no Brasil passa pelo diálogo e pela participação efetiva da sociedade civil”.
A mesa de abertura da 2ª COMIGRAR reuniu diversas autoridades e lideranças refugiadas e migrantes. Estiveram presentes o Secretário Nacional de Assistência Social, do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), André Quintão Silva; a Secretária Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, Anna Paula Feminella; o Secretário Adjunto da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, do Ministério da Saúde, Jérzey Timóteo Ribeiro Santos; o Defensor Público-Geral, da Defensoria Pública da União (DPU), Leonardo Magalhães; o Procurador Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal, Nicolao Dino; o Presidente da Comissão Nacional do Direito Migratório do Conselho Federal da OAB, Floriano Texeira Filho; e a Decana de Pesquisa da Universidade de Brasília (UnB), Olga Ferreira.
Participaram também lideranças refugiadas e migrantes que fizeram parte da Comissão Organizadora da COMIGRAR, incluindo Daniel Diowo Otshudi, representante do Centro de Referência de Atendimento para Imigrantes (CRAI RIO), Hennis Marielis Moraleda Borja, liderança indígena Warao; Rockymillys Basamante, venezuelana; e Richardson Yonel Civil. Esteve na mesa de abertura, Benazira Djoco, conselheira migrante no Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), da Presidência da República.
Além do ACNUR, outros representantes de organismos internacionais também compuseram a mesa, como o Chefe de Missão da Organização Internacional para as Migrações (OIM), Paolo Caputo, e a Diretora Técnica da Fundação Pan-Americana de Desenvolvimento, Soraya Pimentel.
A programação da 2ª COMIGRAR incluiu atividades abertas à população com feira de empreendedores, oficinas culturais e infantis, palestras e prestação de serviços públicos.