Organizações lideradas por indígenas refugiados inauguram centros educacionais em Manaus
Organizações lideradas por indígenas refugiados inauguram centros educacionais em Manaus
Dois centros educacionais liderados por indígenas refugiados foram inaugurados em novembro em Manaus (AM), marcando um avanço significativo na promoção da educação bilíngue e intercultural para crianças indígenas. Os espaços, liderados pelo Conselho Warao Yorikuare Taeraja Ja e pela Organização dos Povos Indígenas Venezuelanos no Amazonas e no Brasil (OIVAB), receberam apoio técnico, jurídico e financiamento da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR).
Aprovados pela Gerência de Educação Escolar Indígena da Secretaria Municipal de Educação de Manaus (GEEI-SEMED), os centros — inaugurados nos dias 12 e 13 de novembro — atendem 30 crianças cada um e oferecem aulas de língua e cultura Warao como complemento à educação formal. Essas iniciativas são parte de um esforço conjunto para garantir o acesso à educação, enquanto fortalecem a identidade cultural dos povos indígenas afetados pelo deslocamento forçado.
A educadora e presidente do Conselho Warao Yorikuare Taeraja Ja, Daisy Pérez, tem buscado oportunidades de sensibilizar as comunidades e as escolas para matricular crianças Warao na rede pública de ensino, oferecendo a elas caminhos para um futuro digno.
Na inauguração do centro Nobotomo Naminamo, foi destacada a relevância de preservar os saberes tradicionais. “O deslocamento nos trouxe desafios e nos afastou das nossas terras, mas não do nosso conhecimento ancestral. Como educadora, acredito que o esforço para integrar nossas crianças à educação formal é essencial, mas também precisamos garantir que a nossa identidade não se perca”, afirma.
A presidente da OIVAB, Fiorella Ramos, explica que “a gastronomia, o artesanato e, especialmente, a língua – um dos elementos mais importantes da identidade – foram seriamente afetados” pelo deslocamento forçado.
Com a criação do centro Teribumo a Janoko, ela acredita que esses elementos poderão ser preservados. “Muitas crianças e jovens, alguns já nascidos no Brasil, não falam sua língua nativa nem conhecem as tradições de seu povo. Neste contexto, é importante oferecer formação cultural, como também promover o acesso à educação com o acompanhamento de professores indígenas”, conclui.
Para a estruturação dos espaços, o ACNUR tem apoiado as organizações lideradas por indígenas refugiados com suporte técnico, jurídico e financeiro desde outubro de 2023. A chefe de escritório do ACNUR em Manaus, Laura Lima, afirma que a criação dos centros educacionais liderados por pessoas refugiadas é um exemplo de como a educação pode transcender as adversidades do deslocamento forçado.
“Não se trata apenas de oferecer conhecimento formal, mas de criar espaços onde a identidade cultural e língua materna sejam preservadas, e onde crianças possam crescer conectadas às suas raízes enquanto constroem seu futuro”, diz.
Educação como base para a preservação cultural
As crianças Warao, como muitas de suas famílias, enfrentam os desafios impostos pelo deslocamento forçado, que ameaça suas tradições e identidade cultural. Os centros educacionais surgem como uma resposta a essa realidade.
A criação dos centros foi respaldada pela Lei Municipal n.º 2.781/2021, que estabelece a categoria de Espaço de Estudos da Língua Materna e Conhecimentos Tradicionais Indígenas. A legislação reconhece o direito das comunidades indígenas de Manaus a uma educação bilíngue, intercultural e comunitária, fortalecendo o papel das escolas como espaços de preservação e valorização cultural.
Entre outros pontos, a lei prevê a gestão democrática das escolas indígenas, autonomia pedagógica e a integração dos conhecimentos tradicionais com saberes contemporâneos. Essas diretrizes foram fundamentais para que os centros Warao pudessem se adequar às exigências legais e obter reconhecimento oficial.
Para as crianças que agora têm um lugar para aprender sobre suas origens, os centros são mais do que uma sala de aula — são um lar para a cultura e a identidade Warao, reconstruídas e fortalecidas em solo brasileiro.