Lideranças Warao facilitam o acesso de pessoas indígenas a serviços públicos na Paraíba
Lideranças Warao facilitam o acesso de pessoas indígenas a serviços públicos na Paraíba
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Lideranças Warao foram capacitadas para interpretação cultural em João Pessoa (PB)
O acesso a serviços fundamentais, como educação pública e atendimentos de saúde e assistência social, pode se tornar um desafio para quem não fala a língua portuguesa no Brasil. Entre a população indígena Warao vinda da Venezuela, muitas também não falam o espanhol, o que torna o atendimento em serviços públicos ainda mais desafiador. Para mudar esse cenário, o ACNUR, em parceria com universidades e governos, tem promovido cursos de capacitação de intérpretes comunitários – pessoas responsáveis por fazer a mediação e a tradução nesses contextos. A última foi realizada em João Pessoa (PB) e formou 28 indígenas Warao para a atividade.
O “Curso Introdutório de Interpretação Comunitária em Contexto de Refúgio” foi promovido por ACNUR em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Humano do Estado da Paraíba e com a Universidade Federal da Paraíba, integrante da Cátedra Sérgio Vieira de Mello. Com duração de três dias, ele teve a participação de 28 indígenas, em especial aidamos (nome dado às lideranças em Warao) que se comunicam em português ou em espanhol com mais facilidade.
Abel Rattia foi um dos aidamos que participaram do curso. Atualmente, ele trabalha como intermediador cultural contratado pelo Centro Estadual de Referência de Migrantes e Refugiados da Paraíba (Cemir), dentro da Secretaria de Desenvolvimento Humano. Ele acompanha diariamente outras pessoas da etnia Warao nos serviços públicos – profissão que também exercia antes de deixar a Venezuela, há sete anos. “Nós somos todos iguais, mas alguns não falam espanhol nem português, por isso precisa da tradução para o Warao”, afirma. “Nós queremos viver bem aqui no Brasil, que nossa família viva bem e tranquila. Por isso, é importante que todos tenham acesso aos serviços de saúde, atendimento para alimentação, escolas. Já estamos organizados aqui e estamos melhorando a nossa situação”, completa.
Atualmente, o Brasil acolhe mais de 12,5 mil pessoas indígenas refugiadasLink is external – dessas, mais de 8 mil são venezuelanas da etnia Warao. Segundo a assistente de proteção do ACNUR, Lyvia Barbosa, o idioma ainda é a principal barreira para acessar serviços públicos essenciais. “Esse curso visa facilitar a comunicação das pessoas nos equipamentos públicos. Participam pessoas que já falam português ou espanhol e que recebem treinamento para facilitar a comunicação para aquelas pessoas Warao que ainda não falam português”, explica.
O curso teve como objetivo a formação básica, com enfoque maior em interpretações para atendimentos de assistência social e em serviços de saúde. De acordo com a professora Jaqueline Nordin, que ministrou o curso, a interpretação da linguagem técnica ainda é o maior desafio nessa atividade. “Nos serviços de saúde, os profissionais usam uma linguagem própria da medicina, que é a parte mais complicada para ensinar, porque os alunos ainda estão aprendendo o português”, afirma. A dificuldade em aprender, porém, não pode ser maior que a garantia do acesso a direitos. “A interpretação comunitária é direito fundamental, prevista na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na nossa Constituição. A gente precisa fornecer intérpretes para os serviços públicos, para que essas pessoas vulnerabilizadas linguisticamente tenham o atendimento igual a outra pessoa que fala a língua portuguesa”, destaca.
Embora em minoria, a presença de lideranças femininas foi essencial no curso. Segundo a aidamo Rosenda Jimenez, a interpretação comunitária feita por mulheres é a base para que as indígenas tenham acesso aos serviços, em especial de saúde. Ela explica que, na presença de homens, nem sempre as mulheres se sentem confortáveis para compartilhar o que sentem, e que também os homens não conseguem fazer a interpretação adequada, porque não passam pelos mesmos problemas. “A maioria das mulheres não sabe falar espanhol, menos ainda o português, apenas Warao. Por isso precisamos de ajuda. As mulheres quando falam com outras mulheres, entendemos mais, porque são assuntos de mulheres”, ressalta.
Confira no vídeo a seguir um pouco mais sobre o curso: